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A história é um organismo vivo: uma entrevista com Rosângela Rennó

History Is a Living Organism: A Conversation with Rosângela Rennó
Textos relacionados ao trabalho

  • Paisagem de casamento


Texts linked to the work Wedding Landscape


    A artista brasileira reutiliza fotografias descartadas para resistir
à "ignorância estrutural" e ao apagamento deliberado da história. Rosângela Rennó não é fotógrafa, mas a fotografia é tanto sua matéria prima quanto seu assunto. Por mais de trinta anos, a artista brasileira tem se inspirado em arquivos esquecidos e fotos anônimas para criar obras de arte que trazem à tona histórias marginais. No final de 2021, a Pinacoteca do Estado de São Paulo realizou uma grande retrospectiva da artista, que está sediada no Rio de Janeiro. O trabalho de Rennó nos convida a permanecer nas superfícies e bordas desgastadas da modernidade tecnológica e nos propõe questões importantes: quem tem direito à visibilidade? Quem tem direito à opacidade? Como são construídas as narrativas históricas através da cultura visual? E que histórias esquecidas podem ser resgatadas? 

    Conversamos recentemente com Rennó sobre as origens distintas de suas cinco obras na coleção do MoMA, seus métodos de pesquisa e seus pensamentos sobre os regimes reacionários do Brasil passado e do presente. Esta conversa faz parte do Giving a Body to Time uma série de entrevistas com artistas da América Latina cujas obras entraram no acervo do MoMA em 2017 como parte de 90 obras de arte contemporânea doadas por Patricia Phelps de Cisneros. Com um título que cita a artista brasileira Jac Leirner, a série se concentra em obras dos anos 80 e 90 que centram o corpo em práticas experimentais e conceituais, desafiando os parâmetros dos meios artísticos tradicionais. Dando corpo ao tempo é a terceira série de entrevistas que fazem parte da pesquisa de longo prazo sobre a doação de Cisneros ao museu. 

    Elise Y. Chagas: Rosângela, você trabalha com fotografias encontradas, arquivos, álbuns, coleções institucionais, além de uma grande variedade de formatos e tecnologias de imagem. Como você descreveria sua abordagem histórica, teórica e prática da fotografia? 

    Rosângela Rennó: Eu costumo dizer que minha aproximação aos temas das humanidades, da história e seus apagamentos e à própria história da fotografia, e de seus usos e funções sociais parte sempre da imersão nas próprias imagens e coleções que encontro, tanto no Brasil quanto no exterior. A maneira de trabalhar é próxima à rotina do pesquisador, na medida em que meu envolvimento com um conjunto específico de imagens pressupõe uma pesquisa sobre sua origem, seu destino e das razões da sua existência. Na maioria das vezes, me interesso pelas coleções que de alguma maneira foram destinadas ao esquecimento como, por exemplo, nos arquivos mal classificados ou mal armazenados, à beira da destruição, ou arquivos colocados à venda em mercados de pulga ou mesmo encontrados no lixo. O abandono de uma imagem confere a ela um caráter ‘anônimo’, embora saibamos que toda foto tem uma autoria. Além disso, a imagem que foi descartada, não importa por qual razão, tem muito a revelar, talvez até mais do que uma fotografia devidamente classificada, cuja autoria é inequívoca. Ao buscar as razões do seu abandono ou esquecimento, creio conseguir compreender melhor a existência dessas imagens no mundo e conectá-las com alguma humanidade, através de aspectos políticos, éticos ou estéticos. 

    Madeline Murphy Turner: Wedding Landscape é uma das mais intrigantes de suas obras. A obra é uma coleção de negativos organizados como uma cachoeira de imagens suspensas entres duas placas de acrílico. Quais são as imagens que vemos? Onde você as encontrou? 

    RR: Em 1994 fui a Havana, Cuba, pela primeira vez, onde ganhei uma caixa inteira de negativos fotográficos realizados em um estúdio local. A caixa deveria ter uns 7 quilos. Os negativos em formato 120 e 35mm continham a documentação de cerimônias de casamento. A fotógrafa que administrava o estúdio me levou ao sótão e me disse para levar tudo o que quisesse, pois o estúdio não tinha mais interesse em guardar aquele material. Apenas uma cópia dos negativos era entregue ao cliente. Como o material fotográfico era muito escasso no país, sequer era cogitada a possibilidade de fazer uma nova cópia, posteriormente. Esse material não era submetido a nenhum tipo de classificação nem era guardado pelo nome do cliente, tornando-se inútil, um material que seria futuramente destinado ao lixo. Com este material criei algumas séries específicas, e duas peças especiais, a partir dos próprios negativos, uma das quais foi Wedding Landscape

    De maneira geral, todas as mulheres nos negativos estavam vestidas com vestidos de noiva mas nenhuma das cerimônias foi realizada em alguma igreja. A documentação seguia um certo protocolo que era o mesmo para todos os casais de noivos: foram realizadas em um ambiente clássico, fotos no sofá, fotos diante de um espelho, etc., todas culminando com a foto do casal, despedindo-se, dentro de um carro ou em cima de uma motocicleta. Não me lembro mais de quantos casais havia em cada rolo de negativo. O que me impressionou foi o fato de que a sequência de imagens era idêntica para todos os casais envolvidos, seguindo um modelo pré-estabelecido. 

    EYC: Como a obra se relaciona com o gênero de paisagem—que está no título—e o gênero de retrato? 

    RR: A repetição das cenas, a monotonia da documentação foi o que de fato me interessou, naquela coleção de negativos. Percebi que a quantidade de cenas seguindo um padrão de repetição poderia funcionar como uma espécie de textura e a disposição dessas tiras de negativos, entre placas de acrílico, sugeriria a sobreposição de planos, como numa paisagem. O formato grande leva o espectador, de início, a ver uma massa de pretos, cinzas e transparências, constituídas de detalhes indistintos. Mas ao se aproximar, percebe que há uma infinidade de ‘unidades’ que se repetem. Essa uniformidade foi justamente isto o que me levou a pensar numa grande paisagem, onde o retrato individualizado se perde na massa escura do conjunto. Quando estamos diante de uma paisagem alternamos nossa visão, ou nosso foco, para sua completude ou para seu detalhe aproximado.

    MMT: O que os negativos, tais como os mostrados neste trabalho, revelam que as fotografias não o fazem? 

    RR: Dentro do princípio da fotografia analógica, os negativos e os diapositivos estabeleciam a conexão direta entre a imagem fotográfica e o objeto ou indivíduo representado. Hoje, na era digital, a transformação em bytes e pixels afasta a imagem da sua relação indicial com o objeto representado. Meu uso de negativos manifestava um desejo de manter essa conexão com as cenas do casamento reproduzidas no filme, e não reproduzir mais uma vez aqueles momentos documentados. Esse desvio dos fins costumeiros do negativo me possibilitou aproximar-me da ideia de uma paisagem congelada, constituída pelas inúmeras unidades, quase indistintas, confinadas entre as placas de acrílico. 

    MMT: Em Sem Título (Red Boy) (1996), um trabalho da Série Vermelha (1996–2003), o “menino vermelho” do título é quase imperceptível. Você poderia falar sobre seu interesse pelos limites da percepção e a linha entre visibilidade e invisibilidade? Como é que este foco opera em relação ao seu interesse pela história do Brasil? 

    RR: Nos anos 90, me engajei num projeto mais amplo de produzir ‘opacidades’ sobre as imagens fotográficas, principalmente sobre os retratos. Deixar a fotografia em um nível mínimo de visibilidade é forçar o espectador a procurar pela profundidade da imagem, investigando a sua superfície. Nesse processo, eu conto com a capacidade do espectador investir em suas próprias memórias para ‘completar’ aquilo que não consegue de fato ‘ver,’ naquela superfície. 

    Alguns trabalhos daquela década eram de fato muito conectados com a questão da precariedade dos nossos arquivos no Brasil e de uma certa ‘amnésia histórica’, que foi agravada por nossa ditadura de mais de vinte anos (1964–85) e que tem se repetido nas últimas décadas. A construção da história em nosso país se vale tanto de indícios fracos e documentos imprecisos, quanto de arquivos inteiros deliberadamente destruídos ou abandonados, pois muitas vezes não interessa que a história seja contada com fidedignidade. Como exemplos, temos muito poucos registros dos tempos coloniais; arquivos sobre a escravidão foram queimados para que a República nascesse sem máculas; arquivos e museus inteiros são abandonados até que um incêndio ou desabamento ou inundação dê cabo deles. Resumindo, se a destruição não ocorre intencionalmente, ela ocorre por negligência. Hoje reconheço a ideia de um projeto deliberado de ‘ignorância estrutural’, que conta com processos de leituras equivocadas e até o apagamento deliberado de imagens e documentos sobre fatos históricos específicos. Hoje, mais do que nunca, esse projeto renasce com força pela extrema direita que tenta criar e disseminar falsas narrativas, contando com a falta de um projeto educativo bem fundamentado. 

    EYC: A fotografia tem servido há muito tempo aos propósitos de encarceramento e de vigilância (estou pensando no desenvolvimento da fotografia policial no século XIX através do trabalho de Alphonse Bertillon). Sem título (América e Cristo) e Double Crown são obras de séries maiores (Cicatriz e Vulgo,respectivamente) que apresentam fotografias provenientes do arquivo médico de uma penitenciária estadual em São Paulo. Qual foi seu interesse neste arquivo, e como você chegou a acessá-lo e trabalhar com ele? 

    RR: Fiquei sabendo da existência do acervo fotográfico do Museu Penitenciário Paulista através de um artigo de jornal em 1995. A minha primeira visita ao Museu me mostrou que a realidade estava muito distante de um acervo de um verdadeiro museu. Mais de 15.000 negativos de vidro estavam reunidos numa sala da Academia Penitenciária do Estado de São Paulo em caixas de papelão dispostas no chão, algumas parcialmente destruídas. Levei 9 meses para obter a autorização para organizar e higienizar parte deste material produzido na Penitenciária do Estado de São Paulo no início do século 20. A pesquisa histórica que iniciei me levou a constatar que essa vasta documentação nunca serviu para grande coisa, pois nunca foi preparada para ser pesquisada ou mesmo manuseada. A inexistência de uma finalidade primeira e essencial para aquela enorme coleção de negativos era algo que me parecia absurdo, beirando a surrealidade. Isso me apontou uma série de questões que se tornaram muito importantes em alguns projetos que vieram em seguida sobre a constituição e a manutenção dos arquivos históricos no Brasil e o projeto institucional de ‘ignorância estrutural’ no nosso país. 

    Entre os negativos de vidro do acervo do Museu Penitenciário Paulista havia a documentação de tatuagens, retratos de dupla-efígie (modelo criado por Bertillon), e fotografias de corpo inteiro, nu, dos presos. Estava claro que todo o sistema de documentação fotográfica desenvolvido nas penitenciárias do Estado de São Paulo servia para identificar o preso reincidente. Além disso, a documentação também sugeria uma aproximação com as teorias positivistas sobre comportamento criminal, criadas no século XIX. A partir da pesquisa realizada, escolhi alguns negativos de tatuagens e das cabeças dos presos, vistas por trás. O projeto aqui tratava de humanizar o ‘corpo fotográfico’. 

    EYC: Você pode dizer mais sobre esta ideia? 

    RR: Depois de ter trabalhado por alguns anos com fotografia vernacular e retratos para fins de identidade, a investigação no acervo do Museu Penitenciário Paulista abriu para mim um novo horizonte. Isso não foi apenas porque se tratava de uma outra categoria fotográfica, a ‘fotografia criminal', mas principalmente pelo ineditismo naquele ‘olhar’ de vigilância. Havia um cuidado nos enquadramentos que denotavam um certo grau de voyeurismo e sensualidade naquelas fotos, que era muito diferente da documentação clássica das tatuagens, tal como era feita no século XIX. O corpo retratado ali, daquela maneira, me levou a uma construção de sentidos que tentava trazer de volta uma humanidade retirada daqueles homens encarcerados. 

    EYC: Um projetor de vídeo sobre um tripé projeta os apelidos dos presidiários. O texto é rapidamente reproduzido em um pequeno pedaço de plexiglas com o ritmo de um caça-níqueis. Como foi realizado este trabalho? 

    RR: Passei mais de um ano colecionando apelidos de criminosos, que encontrava na seção policial dos jornais brasileiros. A coleção começou como mera curiosidade, como uma forma de pensar a ideia de anonimato, em contraste com a ideia de identificação através do retrato; especialmente a identificação criminal com a qual eu estava trabalhando nas fotos do Museu Penitenciário. Os apelidos em português brasileiro são, de forma geral, muito sugestivos pois evocam características muito peculiares dos indivíduos que se identificam através deles. Eu me divertia muito quando encontrava referências a dois apelidos diferentes atribuídos à mesma pessoa. A ideia era usar um dispositivo que sugerisse a geração de novos apelidos por meio de letras que se substituíssem ao infinito: um efeito de ‘geração espontânea’. Então o meio escolhido foi o vídeo, gerado a partir da animação das letras e palavras em AfterEffects. Ao todo são 500 apelidos, em loop. O projetor de vídeo mais portátil na época, era o Sony CPJ- 200, que tem um formato redondo, eu decidi então acoplá-lo a um tripé e a estrutura completa se assemelhava a um pequeno robô, em escala humana, gerador de ‘identidades falsas’. 

    MMT: Referindo-se ao lugar da memória, você disse que seu trabalho não é aquele que “volta ao passado, mas aquele que protege histórias públicas e privadas, pequenas e grandes tragédias, tanto individuais quanto coletivas, no presente e no futuro”. Como você pensa a relação entre a memória e o arquivo, o pessoal e o institucional? 

    RR: Hoje, mais do que nunca, questionamos o valor da grande história, dos grandes feitos; a história é um organismo vivo, está em permanente releitura e reavaliação, sendo recriada por diferentes vieses, na tentativa de fazer com que as sociedades compreendam seus próprios erros estruturais. Não estou aqui nem considerando as falsas narrativas, bastante nocivas, mas estou considerando as novas narrativas que colocam em perspectiva histórias que sempre foram negligenciadas. A imagem de um assassinato ocorrido nos Estados Unidos foi viralizada pela internet acirrou o debate sobre o ‘racismo estrutural’ que persiste em países como os EUA e o Brasil. Parece que o assassinato ‘despertou’ também a população brasileira. Infelizmente, assassinatos como o de George Floyd são muito recorrentes no Brasil, ocorrendo numa base quase diária, mas nenhum deles teve ou tem o alcance necessário para provocar a transformação necessária. Em nosso país estamos demasiado acostumados e tornamos invisíveis esses episódios recorrentes de tragédias individuais. Além da catarse e da memória coletiva, os relatos, as narrativas e os arquivos têm que existir e resistir, para que as próximas gerações não cometam os mesmos erros. 


    CHAGAS, Elise; TURNER, Madeline Murphy. A história é um organismo vivo: uma entrevista com Rosângela Rennó. In MoMA Magazine, 2022, disponível em: https://www.moma.org/magazine/articles/769.
    The Brazilian artist repurposes discarded photographs to fight “structural ignorance” and the willful erasure of history. Rosângela Rennó is not a photographer, but photography is both her material and her subject. For over 30 years the Brazilian artist has drawn from forgotten archives and anonymous photos to create artworks that bring marginal histories into focus. Earlier this year, the Pinacoteca of the state of São Paulo hosted a major retrospective of the artist, who is based in Rio de Janeiro. Rennó’s work invites us to linger on the worn surfaces and frayed edges of technological modernity and poses important questions: Who has the right to visibility? Who has the right to opacity? How are historical narratives constructed through visual culture? And what forgotten stories might be salvaged? 

    We recently spoke to Rennó about the distinct origins of her five works in MoMA’s collection, her research methods, and her thoughts about Brazil’s reactionary regimes past and present. This conversation is part of Giving a Body toTime, a series of interviews with Latin American artists whose work became part of MoMA’s collection in 2017 as part of 90 contemporary artworks donated by Patricia Phelps de Cisneros. With a title that quotes from the Brazilian artist Jac Lerner, the series focuses on work from the 1980s and 1990s that center the body in experimental and conceptual practices, challenging the parameters of traditional artistic mediums. Giving a Body to Time is the third series of interviews that are part of a long-term investigation into the Cisneros gift to the museum. 

    Elise Y. Chagas: Rosângela, you work with found photographs, archives, albums, institutional collections, and a breadth of other formats and imaging technologies. How would you describe your approach to photography? 

    Rosângela Rennó: I usually say that my interest lies in the humanities, in history and its erasures, and in the history of photography itself, its social uses and functions. All of this begins with an immersion into the images themselves, in collections I find in Brazil and abroad. My work process resembles a researcher’s, because my involvement with a specific set of images requires investigating their origins, their fate, and the reasons for their existence. Mostly, I am interested in collections that were destined to oblivion or
    destruction, such as in badly classified or stored archives, or archives that come up for sale in flea markets or are found in the trash. The discarded image takes on an “anonymous” quality, though of course it was made by someone. Beyond this, the discarded image has much to reveal, perhaps even more than one that has been classified. In looking for the reasons these images have been abandoned, I believe I am better able to understand their existence and connect them to some form of humanity through their political, ethical, or aesthetic aspects.

    Madeline Murphy Turner: Wedding Landscape is one of the most intriguing of your works. It is a collection of negatives organized as a cascade of images shown between two panes of acrylic. What are the images we see? Where did you find them?

    RR: In 1994 I went to Havana for the first time. There I acquired an entire box of negatives produced in a local studio. It must have weighed about seven kilos. The 120 and 35mm film negatives documented wedding ceremonies. The photographer who ran the studio took me to the attic and told me I could take whatever I wanted, because the studio was no longer interested in keeping them. Only small copies of those negatives had been given to the client. Since photographic material was very scarce in Cuba, the possibility of subsequently printing new copies was never considered. The negatives hadn’t been cataloged nor kept under the client’s name, thus becoming useless. I used them to create several series and two unique works, one of which was Wedding Landscape.

    In general, all of the women in the negatives wear bridal gowns, although none of the ceremonies were held in churches. The documentation followed a protocol that was the same for all the couples: they were shot in traditional settings, on couches, before a mirror, etc., culminating with a shot of the couple waving goodbye from a car or a motorcycle. I no longer recall how many couples there were on each roll. What struck me was the fact that the sequence of images was identical for every couple involved.

    EYC: How does the work engage with landscape—which is in the title—and portraiture?

    RR: The repetition of the scenes and the monotony of the documentation in that collection of negatives was what interested me. I realized that the quantity of scenes that followed a pattern could function as a texture, and that the arrangement of these strips of negatives in between acrylic sheets would suggest the juxtaposition of planes, as in a landscape. The large format initially leads the spectator to see a mass of blacks, grays, and transparencies, made up of indistinct details. But upon closer examination, it is possible to see an infinity of “units” that repeat themselves. This uniformity was precisely what led me to think of a great landscape, in which the individual portrait is lost in the dark mass of the whole.

    MMT: What do negatives, such as the ones shown in this work, reveal that developed photographs do not?

    RR: In the beginning of analog photography, negatives and slides were records that seemed to most closely register the direct connection between the photographic image and the object or individual represented. This relationship is clearer and less equivocal than the many transformations digital images undergo today as they are converted into bytes and then pixels. My use of negatives represented a desire to maintain that connection with the wedding scenes reproduced on the film, and not to reproduce once more those documented moments. In deviating from the usual purpose of the negative, I could approach the idea of a frozen landscape, consisting of countless, quasi-indistinct units, confined between the acrylic sheets.

    MMT: In Untitled (red boy) (1996), a work from the Red Series (1996–2003), the boy in the title is barely discernible. Can you talk about your interest in the play between visibility and invisibility, and about how it operates in relation to the history of Brazil?

    RR: In the 1990s, I engaged in a broader project to produce “opacities” in photographic images, mostly in portraits. When the image in a photograph is barely perceptible, it forces the spectator to draw closer to investigate its surface. In this process, I depend on the spectator’s ability to rely on their own memories in order to “complete” that which they cannot in fact “see” in that surface.

    Some works from that decade were connected to the precarity of our archives here in Brazil, and to a certain “historical amnesia” that was aggravated by our 20-year-plus dictatorship (1964–85) and has recurred in the last few decades. The construction of history in our country relies heavily on weak evidence and imprecise documents, as well as entire archives deliberately destroyed or abandoned, because it doesn’t seem to matter whether the story is told truthfully. For example, we have very few records of colonial times. Archives about slavery were burned so that the birth of the Republic would be remembered as a bloodless event; entire archives and museums are abandoned until a fire or flood finishes them off. If destruction does not occur intentionally, it occurs through negligence. Nowadays I recognize the existence of a deliberate project of “structural ignorance,” which relies on misreading and even deliberate erasure of images and documents about specific historical facts. Today, more than ever before, this project has been energetically revived by the far right in its attempts to create and disseminate false narratives, exploiting the absence of a strong educational system.

    EYC: The history of photography has long served the purposes of surveillance and incarceration. I’m thinking of the development of police photography in 19th-century France through the work of Alphonse Bertillon. Untitled (America e Cristo) and Double Crown are works from larger series (Cicatriz and Vulgo, respectively) that feature photographs drawn from the medical archive of a state prison in São Paulo. Can you tell us about your interest in these archives, and how you came to work with them?

    RR: I learned about the existence of the São Paulo Penitentiary Museum’s photo collection through a newspaper article in 1995. My first visit there confirmed that the reality there was quite different from the collection of a real museum. Over 15,000 glass negatives were stored on the floor of a room in the São Paulo state penitentiary in cardboard boxes; some were partially destroyed. It took nine months to obtain authorization to organize and clean a portion of that material. The historical investigation I undertook led me to realize that the vast documentation was never accurate, as it was never prepared to be researched or even handled. The lack of a purpose for this enormous collection of negatives was something that seemed absurd to me, bordering on the surreal. This pointed me to a series of issues that became important in projects about the maintenance of public archives and the existence of “structural ignorance” in Brazil.

    Among the negatives at the São Paulo Penitentiary Museum were images of tattoos, double mugshots (a model created by Bertillon), and other photographs of inmates. Clearly, the entire photographic documentation system developed in São Paulo state prisons served to identify repeat offenders. I selected some negatives of tattoos and inmates’ heads, pictured from behind. Here my project was to humanize the “photographic body.”

    EYC: Can you say more about this idea?

    RR: After having worked for some years with vernacular photography and ID photos, my investigation of the São Paulo Penitentiary Museum’s collection opened a new horizon for me. Not only because it was another photographic category—that of “criminal photography”—but also because of the novelty of the surveilling “gaze.” The careful framing of the images made in the São Paulo state prison suggested a certain degree of voyeurism and sensuality that was very different from the classic documentation of tattoos from the 19th century. The body as portrayed there, in that manner, inspired me to attempt to restore a humanity that had been taken from those incarcerated men in the series of works that came out of this archive.

    EYC: In Vulgo/Texto you use found words rather than photographic materials. A video projector on a tripod projects the nicknames of the incarcerated. The text cycles quickly on a small piece of plexiglass with the rhythm of a slot machine. How did this work come about?

    RR: I spent over a year collecting the nicknames of wanted men, which I found in the police sections of Brazilian newspapers. The collection began as mere curiosity, as a way of thinking about the idea of anonymity in contrast to the idea of identification through portraiture, especially the criminal identification that I was working with in the photos from the Penitentiary Museum. Generally speaking, Brazilian Portuguese nicknames are quite suggestive because they evoke very particular features of individuals. But funnily enough I would sometimes encounter two nicknames attributed to the same person. The idea was to use a device that would suggest the generation of new nicknames by means of letters that might be continually replaced. So, I made a video, generated from animations of letters and words in After Effects. There are 500 nicknames that loop. The most portable video projector of the day was the Sony CPJ-200, which has a round shape, and I decided to place it on a tripod. The structure resembled a robot at human scale, a generator of “false identities.”

    MMT: Referring to the role of memory, you have said that your work is not one that “turns back to the past, but one that protects public and private stories, small and great tragedies, both individual and collective, in the present and in the future.” How do you navigate the tension between memory and the archive, the personal and the institutional?

    RR: Nowadays, more than ever before, we question the value of grand historical narratives, of great accomplishments; history is a living organism, perpetually reread and reassessed, recreated according to different biases in an attempt to lead societies to understand their own structural mistakes. Here I am leaving aside false narratives, which are extremely toxic, to consider new narratives that put long-neglected histories into new perspective. The image of a murder that took place in the United States went viral and ramped up the debate on “structural racism” that persists in countries such as the USA and Brazil. It seems that the murder also “awakened” the Brazilian population. Unfortunately, murders such as that of George Floyd are highly common in Brazil, occurring on an almost daily basis, but none of them have had the reach to provoke the necessary transformation. In our country, these recurrent episodes of individual tragedy have become invisible. Beyond catharsis and collective memory, accounts, narratives, and archives must exist so that future generations do not make the same mistakes.


    CHAGAS, Elise; TURNER, Madeline Murphy. History Is a Living Organism: A Conversation with Rosângela Rennó. In MoMA Magazine, 2022, avaiable in: https://www.moma.org/magazine/articles/769.
    Translated from Portuguese by Steve Berg