Pequena ecologia da imagem: um glossário em construção 

Little Ecology of the image: a glossary under construction

Textos relacionados ao trabalho


Texts linked to the work Hercule & Hippolyte

    […] Quem jaz nessas tumbas? Ninguém, pois os mortos são ninguéns, eles já não existem e, portanto, não jazem em lugar nenhum. O que guardam esses túmulos são despojos, os despojos de quem, então? De Hippolyte Bayard (1801-1887) e de Hércules Florence (1804-1879), dois pioneiros da foto- grafia pouco reconhecidos na sua época. O apoio de François Arago (1786-1853), secretário da Academia de Ciências da França, fez que Louis Daguerre (1787-1851) patenteasse seu invento, ficando outros pesquisa- dores sem crédito. Bayard divulga, pouco tempo depois, uma espécie de “protesto-fotográfico” - um autor- retrato em que Bayard fingia ter cometido suicídio. Com o torso nu, olhos fechados, as mãos e o rosto escurecidos, o fotógrafo está apoiado numa parede. No verso, escreve: 

    O cadáver que aqui vê é o de M. Bayard, inventor do processo que acabou de vos ser mostrado. Até quanto sei, este incansável experimentador andou ocupado por cerca de três anos com a sua descoberta. O governo, que por um lado tem sido muito generoso com o Senhor Daguerre, disse que nada poderia ser feito em prol do Senhor Bayard; assim o pobre desgraçado afogou-se. Ah os caprichos da vida humana...! 

    Em Campinas (SP), Hércules Florence, cientista francês radicado no país, cunhou o termo fotografia e inventou a impressão fotográfica. Suas descobertas foram resgatadas do esquecimento quase um século depois de sua morte. 

    Agora, os dois jazem lado a lado, nesse trabalho (Hercule & Hippolyte #2, 2019), nestas duas caixas chinesas que guardam outras caixas, as caixas-fotografias que exibem as caixas-túmulos onde restam os resíduos humanos dos corpos que foram Hippolyte e Hércules... Dois homens postergados. Mas também duas câmeras fotográficas, caixas fechadas, que contêm... […]


    MELENDI, Maria Angélica. Pequena ecologia da imagem: um glossário em construção (excerto de texto). In Rosângela Rennó: pequena ecologia da imagem. São Paulo: Pinacoteca de São Paulo, 2021, pp. 129-162.
    […] Who lies in these graves? Nobody, because the dead are nobodies, they no longer exist and therefore lie nowhere. These graves hold the remains—but of whom? Of Hippolyte Bayard (1801-1887) and Hercule Florence (1804-1879), two pioneers of photography who gained little rec- ognition in their time. Louis Daguerre (1787-1851) patented his invention with the support of François Arago (1786-1853), secretary of the French Academy of Sciences, and no other researchers got any credit. Soon afterwards, Bayard released a kind of “protest-photograph”—a self-portrait in which he pretended to have committed suicide. With a naked torso, closed eyes, blackened hands and face, the photographer is leaning on a wall. On the back, he writes: 

    The corpse you see here is that of Mr. Bayard, inventor of the process that has just been shown to you. As far as I know, this tireless experimenter busied himself for about three years with his discovery. The government, which on the one hand has been very generous to Mr. Daguerre, said that nothing could be done for Mr. Bayard; so the poor wretch drowned himself. Ah! the vagaries of human life...! 

    In Campinas (SP), Hercule Florence, a French scientist living in Brazil, coined the term photography and invented photographic printing. His discoveries were rescued from oblivion almost a century after his death. 

    Now both lie side by side in this work (Hercule & Hippolyte #2, 2019), in two Chinese boxes that hold other boxes, the photo-boxes that display the tomb-boxes containing the human remains of the bodies that were Hippolyte and Hercule... Two men who were left behind. But also two cameras, two closed boxes, which contain...  […]


    MELENDI, Maria Angélica. Little Ecology of the image: a glossary under construction (text excerpt). In Rosângela Rennó: Little Ecology of the Image. São Paulo: Pinacoteca de São Paulo, 2021, pp. 129-162.


    Texto completo

    Full text