work title
selected texts
projeto terra de José Ninguém, 2021
projeto eaux des colonies, 2020-2021
- eaux des colonies (les origines), 2020-2021
- eaux des colonies (en construction), 2021
aucune bête au monde, 2019
lanterna mágica, 2012
Río-Montevideo, 2011/2016
corpo extranho africano, 2011
menos-valia [leilão], 2010
matéria de poesia, 2008-2013
a última foto, 2006
apagamentos, 2004-2005
experiência de cinema, 2004
corpo da alma, 2003-2009
bibliotheca, 2002
espelho diário, 2001
série vermelha (militares), 2000-2003
cartologia, 2000
vera cruz, 2000
parede cega, 1998-2000
vulgo/texto, 1998
vulgo [alias], 1997-2003
cerimônia do adeus, 1997/2003
cicatriz, 1996/2023
paisagem de casamento, 1996
hipocampo, 1995/1998
imemorial, 1994
atentado ao poder, 1992
duas lições de realismo fantástico, 1991/2015
paz armada, 1990/2021
anti-cinema (fotogramas), 1989
anti-cinema (discos), 1989
- pequena ecologia da imagem, 1988
Modelos para armar
Do it yourself kitsSólo se vuelve artístico – sólo se politiza – lo que caduca o está atrasado.
Ricardo Piglia
Ricardo Piglia
MODELO I: DAS INSIGNIFICÂNCIAS
- Por qué, a ciertas horas, es tan necesario decir: “Amé esto?”. Amé unos blues, una imagen en la calle, un pobre río seco del norte. Dar testimo- nio, luchar contra la nada que nos barrerá. Así quedan todavía en el aire del alma esas pequeñas cosas, un gorrioncito que fue de Lesbia, unos blues que ocupan en el recuerdo el sitio menudo de los perfumes, las estampas y los pisapapeles.
Julio Cortázar
I.
Uma imensa melancolia parece se desprender das coisas velhas, não das antiguidades, das coisas velhas: as cortinas de macramê da casa paterna, o rádio de baquelita, o aquecedor a querosene, os botões de madrepérola, os vestidos tubinho, antigas fotografias familiares, filmadoras super-8, câmeras fotográficas agora inúteis, gravadores de fita cassete. De alguma maneira, os objetos que usamos ao longo da vida não conseguem perder o encanto que tiveram quando novos; encanto que, entretanto, se transforma em nostalgia, amargura ou desejo.
Já há alguns anos – desde o final dos anos 1980, talvez – os mercados de pulgas foram se transformando em brechós, que se multiplicaram e deixaram de ser frequentados pelos pobres para, pouco a pouco, atrair jovens estudantes, neodân- dis ou moçoilas enfastiadas. A palavra modernariato, neologismo criado a partir do italiano antiquariato, começou a difundir-se junto com o termo vintage, que provém da enologia, para designar objetos-fetiche do século passado.
O uso desses objetos, a meio caminho entre cadáver e relíquia do corpo consagrado, começou a aparecer em colagens e assemblages surrealistas. Porque o surrealismo,
foi o primeiro a ter pressentido as energias revolucionárias que transparecem no “antiquado”, nas primeiras construções de ferro, nas primeiras fábricas, nas primeiras fotografias, nos objetos que começam a extinguir-se, nos pianos de cauda, nas roupas de mais de cinco anos, nos locais mundanos, quando a moda começa a abandoná-los. Esses autores compreenderam melhor que ninguém a relação entre esses objetos e a revolução. (1)
A estética do mercado de pulgas (e sua ética) consiste em substituir o olhar histó- rico sobre o passado por um olhar político, tal como queria Walter Benjamin, para quem os surrealistas descobriram como, nos objetos fora de moda e nas coisas “escravizadas e escravizantes”, estavam latentes energias reprimidas que podiam explodir em “niilismo revolucionário”. (2)
Na atualidade, corre-se o risco de que o fora de moda, que está novamente em moda – como no modernariato e no vintage – perca suas energias reprimidas ao ser atualizado pelas demandas indiferenciadas de memória. Às ruínas da burguesia, cujas cinzas ainda estão quentes, podemos somar as ruínas fumegantes da classe média urbana e – por que não? – as do futuro do proletariado da primeira metade do século xx. (3)
Modernariato, vintage, memorabilia, souvenirs: objetos de desenho, joias, roupas, material escolar, rótulos de produtos, películas, fotografias, livros, postais da Segunda Guerra, do primeiro governo peronista, da Revolução Cubana, da Jovem Guarda, da Alemanha Oriental, da União Soviética, da Guerra Fria, da conquista do espaço... A cultura contemporânea parece estar sempre em confronto com os signos que criou, desenvolveu e destruiu para se perpetuar. Reprimidos, talvez esquecidos, porém ainda vivos, esses signos conservam, todavia, o poder de reacender as cinzas e incendiar as ânsias do sonho utópico que os viu nascer.
II.
Na 29a. Bienal de São Paulo, em 2010, no primeiro pavimento, em um pequeno espaço delimitado por duas paredes, encontrava-se a instalação Menos- -valia [leilão] de Rosângela Rennó, que constava de 73 objetos dispostos sobre as paredes e sobre uma mesa escalonada que ocupava o centro da sala. Cordões de isolamento separavam os objetos dos visitantes. Cada objeto estava perfurado e por esse furo passava uma corrente fina que sustentava uma plaqueta na qual se lia o nome da artista, o nome da instalação, um número atribuído ao objeto e o lugar onde ele fora adquirido. Uma placa na parede esclarecia que os objetos seriam leiloados em data próxima ao fim da 29a. Bienal, pelo leiloeiro oficial Aloisio Cravo, especializado em pintura brasileira.
A artista montou 73 objetos nos quais usou como matéria-prima equipamentos fotográficos e filmográficos descartados, comprados nos mercados de pulgas mais pobres de dois continentes. Em suas derivas pelas feiras de Montevidéu, Rio de Janeiro, São Paulo e Lisboa, pelos tianguis do México, por El Rastro de Madri ou pelos marchés aux puces de Paris, Rosângela Rennó coletou câmeras fotográficas, carrosséis, visores e projetores de slides, dispositivos de estereoscopia, lanternas mágicas, praxinoscópios, microscópios, telescópios, binóculos, lunetas, lupas, espelhos, quebra-cabeças, silhuetas, álbuns de fotos, retratos, porta-retratos e também velhas fotografias.
Na figura contemporânea do artista nômade, à deriva entre centros e periferias, subsiste a imagem modernista do trapeiro – o catador – à deriva também entre o centro e a periferia da cidade para juntar o lixo dos que têm lixo para jogar.
O paradigma do artista como herói da modernidade se desdobra, para Charles Baudelaire, numa corte orgulhosa de despossuídos: o esgrimista, o salteador, o apache, o trapeiro, que
tem de recolher na capital o lixo de cada dia que passou. Tudo o que a cidade grande jogou fora, tudo o que ela perdeu, tudo o que desprezou, tudo o que destruiu, é reunido e registrado por ele. Compila os anais da devassidão, o cafarnaum da escória: separa as coisas, faz uma seleção inteligente; procede, como um avarento com seu tesouro e se detém no entulho que entre as maxilas da deusa Indústria, vai adotar a forma de objetos úteis e agradáveis. (4)
O andar abrupto de Baudelaire que Félix Nadar descreve – “Baudelaire percorria seu bairro e a cidade com um andar aos trancos, nervoso e lânguido ao mesmo tempo, como o de um gato, escolhendo cada paralelepípedo como se evitasse esmagar um ovo” (5) –, diz Benjamin, seria “o passo do poeta que erra pela cidade à cata de rimas” (6), um andar de trapeiro, que se interrompe, a todo instante, para escolher e guardar os objetos descartados.
O trapeiro é também um colecionador: coleciona “os anais da devassidão, o cafarnaum da escória”, os restos das catástrofes passadas que flutuam diante de nós em pura perda. As coisas que o trapeiro resgata desse limbo, que nem sequer é ruína, serão transformadas, pois, à diferença do colecionador, ele não amealha para si, apenas recolhe e encaminha.
Com elegância, delicadeza e humor, Rosângela Rennó montou esses restos e os transformou em objetos-fetiche, objetos-relíquia: objetos ambíguos que deslizam do sagrado ao profano, do sublime ao grotesco, da ironia à melancolia. Acaso não é melancólico o sorriso que esboçamos ao ver aquela câmera fotográfica que tanto desejamos décadas atrás, enclausurada em uma vitrine que a conserva e a alija de nós, como se fosse uma tânagra ou um pequeno hipopótamo egípcio de cerâmica vitrificada?
Em cada objeto se sobrepõem camadas de recordações; é possível que a primeira percepção seja a escassa temporalidade da coisa em si, porém, a partir desse dado, começam a brotar as memórias do uso, das condições de uso, do lugar onde foi comprada, das imagens que quase sempre vêm junto, das situações cotidianas nas quais se incluíram e, por fim – last but not least –, da preexistência mnemônica de obras da própria artista e de outros artistas.
Os objetos de Menos-valia [leilão] ativam a memória e, in- conscientemente, a modificam, porque a hipotética memória primeira se acresce à memória do objeto evocado. Nesse processo de subtextualidade de “imagens mnemônicas anteriores” (7) que não é citação e muito menos pastiche – no sentido de transmissão de elementos visuais –, reside o fundamento de uma tradição artística.
Diante da instalação, percebe-se que vários objetos evocam obras anteriores de Rosângela Rennó como Realismo fantástico, Puzzles [homem e mulher], O arquivo universal, In Oblivionem, Série vulgo, Série vermelha, Cartologia, Bibliotheca, Corpo da alma e A última foto, nomeando-os em ordem cronológica. Alguns objetos passeiam pela fotografia do século XIX, pela fotografia surrealista e pela jornalística ou pelo voyeurismo das fotografias pornográficas. Sobre outros objetos flutuam alusões aos Bichos de Lygia Clark, a um Bólide de Hélio Oiticica – a inesquecível foto de Mosquito da Mangueira com as mãos no queixo, olhando o Bólide luz 1, apropriação 3, plasticope, 1966 –, aos agrupamentos de fotografias de Annette Messager. Um sentido sutil de ridículo impregna os objetos perfeitos que Rosângela Rennó constrói com elementos populares de sua geração: os abajures feitos com os carrosséis de diapositivos dos projetores Kodak, coroados por cúpulas como as que se usavam nas construções populares dos anos 1980, ou os simulacros de televisores montados com visores de meio quadro, como os que os fotógrafos de rua vendiam na mesma época. Objetos simples que evocam o consume de imagens da classe media baixa no saudoso kitsch daquela época – não inteiramente perdida.
III.
Em Montevidéu, Uruguai, longe do centro da cidade, encontra-se o Museo de la Memoria. Ocupa a Quinta de Santos, um palacete de verão que pertenceu ao ditador Máximo Santos, que governou o país entre 1882 e 1886. Trata-se de residência luxuosa em cujos jardins se encontra um pequeno castelo que servia de casa de bonecas para as filhas do ditador, bem como um zoológico cercado de grades, a leonera (8), de triste fama, pavilhões para criação de pássaros exóticos, uma gruta artificial atravessada por corredores labirínticos e iluminada com luz de gás, fontes, estátuas, cascatas artificiais.
Nessa casa, ainda que em ruínas, a memória das ditaduras recentes se materializa em uma coleção de objetos residuais que, por sua modéstia extrema, parecem ser indignos de ocupar qualquer vitrine. Abundam as fotos, muitas vezes grandes ampliações de peque- nas imagens extraídas da imprensa da clandestinidade, um punhado de uniformes carcerários, portas de celas, panelas de alumínio usadas, a impressora de uma gráfica clandestina, algumas bandeiras, alguns poucos panfletos. O que causa mais emoção, entretanto, o que marca mais o breve passo do tempo são os objetos insignificantes que, destinados ao descarte ou ao esquecimento, confirmam a resistência dos uruguaios durante a ditadura.
VITRINE 1: esferas de rolimã, bolinhas de chumbo, uma garrafa de vidro com uma mecha de pano, pregos dobrados ao meio e soldados em cruz, panfletos manuscritos, boletins reproduzidos em mimeógrafo a álcool. A legenda explica “Esferas y municiones para hacer cavallos resbalar, miguelitos (9), bombas de alquitrán, panfletos y diários de la resistencia”.
VITRINE 2: cinto masculino de couro sobre um diário onde se lê: “El drama de la madre de Castagnetto” e a notícia da desaparição do militante Héctor Castagnetto, sequestrado pelas forças paramilitares.
VITRINE 3: uma pequena caixa de latão que contém um caderninho escrito com letra diminuta. A legenda diz: “Hojas donde se escribió, copiado, el libro ‘Historia del Partido Comunista Vietnamita’ de Ismael Bassin, hecho en el Penal de Libertad”.
VITRINE 4: sobre saquinhos de papel de seda, estão expostos adornos feitos pelos presos políticos: uma cruz, uma aliança, uma agulha, uma pulseira, um anel de sinete e vários medalhões, todos talhados em osso. Há também pequenas esculturas e baixos-relevos feitos em barras de sabão.
A instalação museográfica organiza os objetos como se fossem obras de arte, o que lhes confere um encanto inicial, pois estamos longe da aridez de um museu histórico. O efeito do fora de moda se potencializa na consciência daqueles que (como eu) viveram esse passado sem nunca esperar ver tais objetos elevados à categoria de objetos museificados. “Esferas y municiones para hacer cavallos resbalar, miguelitos, bombas de alquitrán, panfletos y diários de la resistencia.”
Há uma estranha suspensão de valores na exibição das armas rudimentares dos resistentes – não são espadas, nem fuzis, nem metralhadoras – e, ainda que saibamos de sua modesta eficácia, passa por nossa mente a pergunta sobre seu possível uso no século xxi. O coquetel molotov, sobretudo, evoca o espectro de um século xx que nunca cessa.
IV.
Na página Memoria Abierta, inaugurou-se recentemente uma seção nomeada “Vestigios, un ensayo de transmisión a través de los objetos” (10). Os organizadores da página propõem duas questões fundamentais: se os objetos podem estabelecer relações entre passado e presente, e se podem ser utilizados como ferramentas para a transmissão da memória:
Essa proposta busca explorar a capacidade que têm os objetos para estabelecer relações entre passado e presente, de maneira que possam ser utilizados como veículos para a transmissão da memória e, ao mesmo tempo, promovam o debate e a reflexão.
Com esse propósito, revelam e colocam na página fotografias de coisas materiais que familiares e amigos de vítimas da última ditadura militar conservavam daqueles anos. Cada objeto é acompanhado por um relato que o identifica e contextualiza.
Duas vezes vestígio, porque restos e porque fotografias, o que a página exibe são fotos de objetos deixados pelos combatentes mortos e estimados por seus parentes. Essas imagens – fotos de família, cadernos e livros escolares, discos, objetos feitos na prisão, memorabilia peronista – encerram uma memória pessoal e afetiva que muitas vezes está ausente dos relatos históricos.
V.
Em uma foto, vemos um rapaz que levanta no ar um bebê de menos de um ano. O rapaz sorri, a criança olha assustada. Abrem-se outras: em uma, o jovem abraça o menino contra seu peito; na terceira, a família completa: mãe e pai sorriem com o bebê em seus braços.
Essas fotos foram tiradas em uma quinta em San Miguel onde estávamos clandestinos meu marido, meu filho e eu. Meus sogros também tinham vindo de Mendoza e estavam vivendo conosco. Alguns dias antes, havia desaparecido meu cunhado. Vivíamos em uma casa muito simplesinha, em frente havia um arvoredo e atrás outra casa onde viviam meus sogros. Era uma região de quintas, de modo que havia vizinhos, e por isso queríamos dar a impressão de sermos uma família muito normal. Assim, combinamos fazer um dia de visita familiar no qual veio minha irmã, os filhos etc. Todos chegaram escondidos para que não soubessem onde estava a casa. Minha irmã trouxe uma câmera e aproveitamos para tirar muitas fotos. Isso era janeiro de 1976 e meu marido desapareceu seis meses depois. Essa é a única foto que temos de nós dois com nosso filho. (11)
A foto de cinco porta-retratos empilhados comprados na Cidade do México: aquele que está por cima mostra o retrato de um menininho, o seguinte deixa adivinhar a imagem de uma menina, depois as imagens estão cobertas e só se veem marcos dourados. Não se sabe quem são essas crianças, onde estão; adivinhamos por suas roupas que já não devem estar vivas.
LOTE 16
APAGAMENTO POR EMPILHAMENTO
D.O.C. Tianguis de Santa Cruz, Cidade do México, México
C.O. 37,00
L.I. 130,00
DIMENSÕES 30,5 × 25 × 8 cm
DESCRIÇÃO Cinco fotografias p&b (papel de gelatina e prata) em cinco porta-retratos de materiais diferentes, metal e / ou madeira folheada a ouro, sobrepostos.
MODELO II: DA MENOS-VALIA E DA MAIS-VALIA
I.
“Menos-valia”: o dicionário Houaiss nos informa que a palavra “menos- -valia” é um substantivo feminino utilizado na língua portuguesa pelo menos desde 1971. Pertence ao vocabulário da economia e significa “diferença entre o valor contábil líquido de um bem e seu valor venal, quando este é menor que aquele” (12) Sua etimologia indica tradução do francês “moins-value”, dicionarizado em 1765: “diminuição do valor de alguma coisa, perda de valor, diferença entre o produto real e o produto teórico (de uma taxa, de um imposto)” (13) formado por oposição a “plus-value”, “mais-valia”. No site <www.thinkfn.com>, somos informados de que um investidor, muitas vezes, por questões fiscais, terá que vender um investimento no qual tem perdas apenas para realizá-las e poder, assim, abatê-las com outras mais-valias já realizadas; ou seja: “As menos-valias realizadas abatem as mais-valias realizadas no mesmo período fiscal, para efeitos fiscais” (14).
Em espanhol, encontramos uma palavra grafada “minusvalía”, cujo significado é: “1. Diminuição do valor de um objeto ou de um direito contabilizado em dois momentos distintos. 2. Diminuição da capacidade física ou psíquica de uma pessoa” (15). A segunda acepção é usada comumente em contextos psicológicos, na teoria do direito e até no jargão policial com o sentido de incapacidade, capacidade reduzida e até complexo de inferioridade, significado que incorpora entre seus sintomas os sentimentos de fracasso, insuficiência e impotência.
Menos-valia [leilão] de Rosângela Rennó desliza entre esses sentidos, uma ferida que não acaba de cicatrizar entre as operações monetárias e o lugar íntimo dos sentimentos fracassados e os afetos perdidos. A estratégia perversa da artista que transmuta o valor decadente do objeto descartado no valor potente de um trabalho de arte legitimado pela instituição e pelo mercado deixa vislumbrar num relance o quanto pulsa, nesses objetos, uma força que renega da perda e do fracasso.
Sobre as ruínas da modernidade, sobre os escombros do futuro utópico, as tecnologias obsoletas e as imagens perdidas parecem ser infinitamente mais eloquentes que o fluxo interminável e vazio que nos cobre de imagens perfeitas. A impotência de resgatar uma só imagem nessa torrente interminável de desejos e a nostalgia de um tempo anterior à destruição provocam melancolia, uma melancolia, porém, que se aparta cada vez mais do objeto perdido.
II.
Em 2008, Damien Hirst decidiu deixar de lado os intermediários (Jay Jopling, da White Cube, em Londres; e Larry Gagosian, em Nova York) e fazer um leilão de suas obras na casa Sotheby’s, em Londres. O artista centrou sua atividade em fazer o marketing do evento e convidou colecionadores importantes, como a designer de moda Miuccia Prada, o empresário ucraniano Victor Pinchuk e o dono da casa de leilões Christie’s, François Pinault, a seu estúdio em Gloucestershire para uma visita privada, prévia à exibição das obras. A Sotheby’s, por sua vez, cedeu todo o espaço de sua galeria em Londres e aumentou o contin- gente de vigilância durante os dias de visita pública.
A exposição, chamada Beautiful Inside My Head Forever, consta de variações sobre temas familiares do artista. Havia abundância de tan- ques com animais em formol, havia também armários de vidro cheios de qualquer coisa, de diamantes a guimbas de cigarro, pinturas e trabalhos em papel que exibem suas peculiaridades – caveiras, pontos, caleidoscópios spin e mariposas –, disponíveis em todos os tamanhos. O leilão coincidiu com o débâcle do mercado financeiro, o que pareceu sinalizar que a arte era um refúgio seguro para os investimentos das grandes fortunas.
É sabido por todos os colecionadores que Hirst “não pinta suas triunfalmente vazias pinturas de pontos – as melhores pinturas de pontos de Damien Hirst são aquelas pintadas por Rachel Howard”, afirma Germaine Greer, crítica de arte do The Guardian, e acrescenta: “Damien Hirst é uma marca, porque a arte do século XXI é marketing” (16).
No mesmo texto, Greer contesta a declaração de Robert Hugues, de que não existe nenhuma ressonância da narrativa bíblica no Bezerro de ouro, trabalho de destaque na exibição. Para ela o bezerro morto seria, em realidade, um descendente legítimo do ídolo bíblico, um ídolo que venera a potência da riqueza material, porque, como ela acredita, nem o bezerro nem nenhuma das outras obras são trabalhos: “Querido Bob, o leilão da Sotheby’s é o trabalho” (17).
III.
Convidada a participar da 29a. Bienal de São Paulo – que, sob o título de Há sempre um copo de água para um homem navegar, pretendia analisar as relações entre arte e política na arte contemporânea – com a obra Matéria de poesia, Rosângela Rennó propôs ao curador Moacir dos Anjos realizar também um leilão de objetos de sua autoria, que aconteceria nos últimos dias da mostra, em dezembro de 2010.
O trabalho Menos-valia [leilão] já havia sido realizado – como um ensaio piloto com o título de Menos-valia [Subasta] – no Museo Universitario de Arte Contemporáneo (Muac), da Universidad Nacional Autónoma de México (Unam), dentro da programação do evento Jardín de Academus, organizado e curado pelo artista mexicano José Miguel González Casanova.
Esse leilão, realizado em maio de 2010, investigava as possibilidades de atribuir um valor de exposição legitimado a objetos comprados nos tianguis da Cidade do México. Os lotes incluíram objetos variados, não apenas relacionados ao campo da imagem técnica. O que todos tinham em comum era estar à venda nos mais humildes mercados de usados e ter certa aparência carinhosamente kitsch. Sobre o muro do museu e sobre a mesa de exposição, coberta de veludo vermelho, havia brinquedos infantis, bibelôs, frascos de vidro, mas também porta-retratos, visores estereoscópicos, fotografias emolduradas.
No pavilhão da Bienal, o leilão foi realizado dia 9 de dezembro de 2010, depois da hora de fechamento da exposição, no mezanino, em um espaço livre contíguo à cafeteria, da qual se aproveitaram os bancos e onde se acomodaram alguns assentos. O leiloeiro Aloisio Cravo subiu em um pequeno pódio com um parlatório de acrílico e dali dirigiu o leilão, cujos lotes eram mostrados em uma tela de projeção portátil montada. Entre os possíveis compradores, incluíam-se colecionadores como José Olympio Pereira, Dudu Linhares, Oswaldo Corrêa da Costa e Bruno Musatti e curadores como Moacir dos Anjos, Marcelo Araújo e Adriano Pedrosa.
Em um catálogo, disponível em pdf, cada lote era identificado por seu número de ordem. Também estavam discriminados os lugares onde os objetos foram comprados (D.O.C.), o custo do objeto (C.O.), o lance inicial (L.I.), o preço final (P.F.), os materiais utilizados e a dimensão do objeto final.
LOTE 24
CARTES DE VISITE COM AMPLIADORES
D.O.C. Tianguis de Santa Martha, Cidade do México, México c.o. 30,00
L.I. 150,00
DIMENSÕES 20 × 30 × 3,5 cm
DESCRIÇÃO Duas molduras contendo três retratos em p&b (papel de gelatina e prata) escolhidos pela artista, a partir de um conjunto de fotos provenientes do México.
O leiloeiro destacou várias vezes durante sua atuação que nunca havia ouvido falar, no Brasil, de um leilão inteiramente formado por lotes de um mesmo artista e muito menos por lotes pertencentes a uma mesma instalação que estivera em exibição dentro do evento de arte mais importante do país, a Bienal de São Paulo.
Todos os lotes foram disputados e vendidos em meio a uma excitação geral (nada da muda tensão dos leilões de arte da Christie’s ou da Sotheby’s). O leiloeiro Aloisio Cravo anunciou que as obras poderiam ser retiradas a partir do dia 13 de dezembro em seu escritório e que, aos preços alcançados, deveria ser acrescida sua comissão de 5%, como de praxe. A Bienal terminaria dois dias depois, mas a instalação foi desmontada no dia seguinte ao leilão. Então o trabalho foi finalizado. Sua função na 29a. Bienal de São Paulo estava concluída e o espaço antes ocupado pelos objetos foi deliberadamente deixado vazio.
Desde o início do trabalho, com a compra feita por Rosângela Rennó e seus amigos de objetos fotográficos nos mercados de rua de vários países, até o instante em que cada colecionador saiu da casa de leilões com sua obra cuidadosamente embalada, com sua placa de identificação e seu certificado de autenticidade, se desenvolveu um processo performático do qual muitos dos implicados não tiveram consciência.
Porque, como disse Greer a respeito do leilão de Hirst, o leilão era o trabalho. E o trabalho se parece bastante com a vida: a artista criou, os amigos colaboraram, os assistentes assistiram, os curadores curaram, a Fundação Bienal autorizou, o leiloeiro leiloou, os colecionadores compraram e os críticos, como sempre, não criticaram. Como em um déjà vu assustador no qual, a cada instante, o percebido e o recordado se superpõem e se separam simultaneamente, nada escapou ao previsto. As palavras de Aloisio Cravo, “nunca se havia ouvido falar no Brasil de um leilão inteiramente formado por lotes de um mesmo artista” foram verdadeiras e falsas ao mesmo tempo, porque do que ninguém ouvira falar até então era a presença de colecionadores, curadores e artistas transformados inadvertidamente em atores implicados numa ação; mais ainda: atores que representaram seu papel à perfeição, apesar de nenhum script lhes ter sido previamente atribuído.
Menos-valia [leilão] põe também a descoberto muito do que a Bienal de São Paulo oculta ou sonega. No texto de apresentação do catálogo, os curadores afirmam que se esquivaram do modelo frequente nas mostras de arte contemporânea: “do modelo vinculado somente às demandas apressadas do mercado e do espetáculo, marcado pela ansiedade da busca do que é supostamente inédito” (18). Rosângela Rennó, entretanto, leva a avidez do mercado em sua expressão mais radical aos puríssimos vãos livres de Oscar Niemeyer.
Todos sabemos que o mercado de arte contemporânea domina o mercado de arte em geral e que, nos últimos anos, as vendas mais espetaculares têm se dado em leilões, ou seja, no lugar tradicional do mercado secundário, que é onde são testados os critérios de gosto, de valor artístico e de temporalidade, e onde se confirma ou se questiona o valor monetário do trabalho do artista. (19)
Qual seria o sentido de apresentar Menos-valia [leilão] na Bienal de São Paulo? Um leilão que é, ao mesmo tempo, ação artística – resisto à palavra “performance”, que conserva o sentido primeiro de representação – e um leilão verdadeiro?
No texto de apresentação a artista declara que:
Esses objetos passam por sucessivas agregações de valor material e simbólico até seu destino final, a ser definido no dia 9 de dezembro de 2010, quando cada um deles será leiloado dentro do próprio pavilhão da Bienal. Ao adquirir um objeto, o compra- dor receberá o certificado de propriedade de uma parte do projeto Menos-valia [leilão] e poderá incluí-lo em sua coleção de arte.
No campo das ideias, Menos-valia [leilão] pode ser compreendido, também, como uma das práticas contemporâneas mais fortemente vinculadas às atuais teorias da Ruinologia, como a do “recuperacionismo ativo de transformação”, entre outras con- solidadas recentemente. (20)
No primeiro parágrafo, a autora assinala que o comprador de um objeto comprará apenas uma parte do projeto. Sustenta abertamente que o projeto continuará sendo seu e que, por isso, não estará incluído como totalidade em qualquer coleção de arte. A artista esboça um rictus irônico ao aludir a uma nova disciplina, a “ruinologia”, e um de seus ramos, o “recuperacionismo ativo de transformação”.
Artistas contemporâneos, como o cubano Carlos Garaicoa, são embargados por esse sentimento melancólico que as ruínas despertam; no seu caso, os predios inacabados e abandonados de Havana, depois do declínio do socialismo europeu. As ruínas do projeto utópico – não ruínas de um passado luminoso, mas ruínas de um futuro que não aconteceu – são evocadas por Garaicoa como “ruínas do futuro”.
O paradoxo de Garaicoa, que parece aludir à boutade do poeta cubano Nicolás Guillén ao ver pela primeira vez Brasília: “contemplo, atônito, as ruínas do futuro”, desloca para o futuro a noção de ruína, sempre considerada um remanescente do passado.
Na Renascença os restos arquitetônicos das antigas civilizações adquiriram o estatuto de testemunhos, ainda vivos, de tempos mais gloriosos. Objetos e fragmentos de objetos do passado, sem significado nem função, foram investidos com valores estéticos, políticos ou históricos do presente. As ruínas perturbam porque anunciam a iminente perda de sentido que ameaça toda obra humana; mas essa falha na significância transforma-se numa vertiginosa proliferação discursiva. As ruínas com que Rosângela Rennó trabalha são restos de um passado mais ou menos próximo, resíduos da vida moderna que ainda parece existir e proliferar, cada vez mais degradada, nas periferias pobres de nossas cidades opulentas. O que move a artista é um sentimento melancólico que não se regozija no perdido, mas que aceita a perda e a torna produtiva.
Os objetos de Rosângela Rennó indicam pontos de indagação sobre sua própria origem; são lugar de estratégias de reflexão que podem nos dizer mais sobre quem as olha do que sobre o que é olhado.
Ao denominar sarcasticamente a operação de “menos-valia”, Rosângela Rennó parece escamotear a potência inelutável do valor agregado:
LOTE 20
BICHO POLAROIDE
D.O.C. Tianguis de Santa Martha, Cidade do México, México
C.O. 85,00
L.I. 170,00
DIMENSÕES 18 × 30 × 11 cm
DESCRIÇÃO Duas câmeras fotográficas instantâneas Polaroid sx 70 Land, idênticas, coladas. Uma foi adquirida no Rio de Janeiro e a outra no México.
Nesse lote, as duas câmeras Polaroid custaram R$85,00; o lance inicial que, suponhamos, agregaria o valor da mão de obra, o de um material adesivo e o da plaqueta de acrílico com sua correntinha fez subir o preço a R$ 170,00, valor do lance inicial. O preço alcançado no leilão superou quase quatrocentas vezes o valor desse lance. A exibição na Bienal, o leilão inaudito, o prestígio de Rosângela Rennó no sistema da arte internacional, a alusão oportuna aos Bichos de Lygia Clark e até certa semelhança visual com alguns deles, não necessariamente nessa ordem, aumentaram o valor agregado ao objeto. Mas pode-se falar ainda de mais-valia no campo complexo do mercado de objetos suntuários (únicos, raros, exclusivos), no qual se incluem os objetos de arte? Esse campo regula-se através de uma relação específica de oferta e procura, pois o valor monetário que tais objetos alcançam depende quase exclusivamente do valor simbólico que eles têm, asso- ciado a sua exclusividade, ao desejo de possuí-los e ao prestígio decorrente da capacidade de comprá-los e exibi-los.
Rosângela Rennó desvela e exibe os mecanismos do mercado em uma exposição na qual prevalecem obras que, de acordo com a curadoria, não obedeceriam “às demandas apressadas do mercado e do espetáculo” (21). Presentes na mesma Bienal, trabalhos das décadas de 1960 e 1970, como Tucumán arde, La familia obrera, as ações do Grupo Cada ou as situações de Artur Barrio, obras efêmeras de que restam somente registros de época, respondem a essa intenção.
A forma como Menos-valia [leilão] se exibe é própria do mercado: um display de objetos que seriam (e foram) arrematados pelo melhor lance. Essa estratégia de exibição mostra ao público (porém, a qual público?) como os resíduos da indústria cultural podem ser elevados à categoria de obras de arte. A artista declara, através de sua instalação e da ação consequente, que, ao perder seu valor funcional, as coisas comuns, insignificantes, podem alcançar não só um caráter potente e duradouro, como também, por meio da legitimação outorgada pela instituição da arte, um valor monetário elevado.
CODA
O significado das insignificâncias está todo concentrado na carga evocativa que es- ses objetos ainda conservam, em suas vitrines, dentro de suas caixas, fora do leilão. O lote 72, Minha vida através de retratos, comprado no Troca-troca da praça xv, no Rio de Janeiro, encerra, numa simples moldura preta “um álbum sem capa, completíssimo, de uma mulher singular” (22). O que se vê através do vidro é exatamente isto, apenas isto: um álbum sem capa, com a primeira página bastante deteriorada. As folhas estão amarradas por uma fita brilhante de material sintético. Na única página visível há três fotografias, numa delas vê-se uma menina pequena em pé sobre uma cadeira, na outra duas meninas com grandes laços no cabelo, uma sentada, outra de pé sobre um mesmo banquinho, segura pela perna um boneco. A fotografia de uma jovem – a mulher singular? – na praia, com um pé em cima da bola, se superpõe às outras duas no centro da página. Se as fotos são da mesma mulher, entre as primeiras e a última devem ter se passado mais de dez anos. Sobre o papel cinzento do velho álbum, há várias escritas: “Minha vida através de retratos” campeia no cabeçalho da página numa letra manuscrita ornamentada. Sob a foto da menina está escrito, com outra caligrafia, “Españ (R”, o resto da legenda está oculto pela foto da jovem. Sob a foto das duas meninas, a mesma mão traçou “Brasil (Rio de Janeiro) 3 años”; mas a mulher singular corrigiu a legenda e com tinta de outra cor agregou “/4” ao lado do número 3. A foto da jovem esguia numa praia foi superexposta, e seu corpo da cintura para cima está borrado pela luz do sol.
Eis os dados para um relato que começa na Espanha (Restabal, Riaño, Rioja, Rioscuro, Rodalquilar,?) e continua no Rio de Janeiro, eis os dados para começar a imaginar as mãos que montaram o álbum que começou em espanhol e continuou em português: mãos femininas sem dúvida, mãos afetuosas. Em Menos-valia [leilão] o álbum não trata mais da vida de uma mulher singular, mas da vida singular de muitas mulheres imigrantes. Os restos de uma vida que bem podiam findar no lixo ou no Troca-troca da praça XV são reconduzidos agora a uma coleção, depois de terem passado pelos salões da 29a. Bienal de São Paulo.
O trapeiro de Baudelaire se superpõe de novo à imagem do artista; Rosângela Rennó reúne imagens e objetos que perderam todo valor de uso e quase todo valor de troca, recombina-os, singulariza-os e os entrega para outro setor do mercado. A estratégia que opera na construção de Menos-valia [leilão] – recolecção, montagem, exibição, leilão e dispersão – expõe os mecanismos de produção e de alienação dos bens culturais.
Nesse processo interminável – entre a melancolia e o cinismo – Rosângela Rennó nos propõe preciosos enigmas e obscenos modelos para armar.
- Walter Benjamin, Obras escolhidas i: Magia e técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1987, p. 25.
- Id., ibid, p. 25.
- Cf. Hal Foster, “This Funeral Is for the Wrong Corpse”, in Design & Crime. Londres: Verso, 2002, p. 139.
- Charles Baudelaire apud W. Benjamin, Obras escolhidas iii: Charles Baudelaire, um lírico no auge do capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 1989, p. 79.
- Firmin Maillard, La Cité des intellectuels, Paris, 1905, p. 362. Apud W. Benjamin, Passagens. Belo Horizonte: ufmg, 2006, p. 227.
- W. Benjamin, Obras escolhidas iii: Charles Baudelaire, um lírico no auge do capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 1989, p. 79.
- H. Foster, op. cit., p. 67.
- Um poço onde o ditador criava leões e, dizem, costumava jogar seus opositores.
- “Miguelito” era a denominação popular, rio-platense, para pregos grandes dobrados ao meio e soldados em cruz que eram jogados nas ruas com o objetivo de furar os pneus das viaturas da polícia.
- <www.memoriaabierta.org.ar/vestigios>, acessado em jun. 2012.
- <www.memoriaabierta.org.ar/vestigios/objeto.php?id=81>, acessado em jun. 2012.
- Dicionário Eletrônico Houaiss.
- Id., ibid.
- <www.thinkfn.com/wikibolsa/Menos-valia>.
- Pequeño Larousse Ilustrado.
- Germaine Greer, “Note to Robert Hughes: Bob, dear, Damien Hirst is just one of many artists you don’t get”. The Guardian, 22 / 9 / 2008.
- Id., ibid.
- 29a. Bienal de São Paulo (catálogo). São Paulo: Fundação Bienal, 2010, p. 21.
- Terry Smith, What is Contemporary Art? Chicago: The University of Chicago Press, 2009, p. 119.
- Texto de apresentação de Menos-valia [leilão] de Rosângela Rennó. Texto de parede na 29a. Bienal de São Paulo.
- 29a. Bienal de São Paulo (catálogo), op. cit., p. 21.
- Catálogo on-line de Menos-valia [leilão].
MELENDI, Maria Angélica. Modelos para armar. In RENNÓ, ROSÂNGELA. Menos-valia [leilão]: Rosângela Rennó. São paulo: Cosac Naify, 2012, pp. 228-265.
Only what expires or comes late becomes artistic, becomes politicized.
Ricardo Piglia
Ricardo Piglia
MODEL I: ON THE INSIGNIFICANT
Why, at certain times, is it so necessary to say: “I loved this?” I loved some blues, a picture on the street, a poor dry river in the north. Bearing witness, fighting anything that would sweep us away. So, these diminutive things hover in the air of the soul, a little sparrow from Lesbia, some blues that occupy, in remembrance, the small site of perfumes, pictures and paperweights.
Julio Cortázar
I.
Immense melancholy seems to emanate from old things. Not antiques, but old things: macramé curtains from your father’s house, a Bakelite radio, a kerosene heater, mother-of-pearl buttons, shift dresses, old family photographs, super-8 camcorders, obsolete cameras, cassette decks. Somehow, objects used throughout our lives cannot lose the allure of when they were new, an allure that, however, has turned to nostalgia, bitterness, or desire.
For some years now – since the late 1980’s, perhaps – flea markets have gone upscale and multiplied; no longer visited by the poor, they now attract young students, neo-dandies or jaded young ladies. The word modernariato, a (Brazilian) neologism coined from the Italian antiquariato, began to proliferate, along with the term vintage, coined from winemaking, both used to classify fetish-objects from the last century.
The use of these objects, standing halfway between corpse and consecrated body relic, began to appear in Surrealist collages and assemblages. Because surrealism
was the first to uncover the revolutionary energies apparent in the “antiquated”, in the first iron constructions, the first factory buildings, the earliest photos, the things now beginning to die out, the drawing-room grand pianos, the clothes of five years ago, the smart watering holes when the fashionable world begins to desert them. These authors understood better than anyone the relationship between these objects and the revolution (1).
The aesthetics of the flea market (and its ethics) consists of replacing the historic view of the past with a political view, as desired by Walter Benjamin, for whom the Surrealists discovered that outmoded objects and “enslaved and enslaving” things contained latent repressed energies that could explode in “revolutionary nihilism” (2).
At present, we run the risk that the outmoded which is back in fashion – as in modernariato and vintage – will lose these repressed energies when it is made current again by the undifferentiated demands of memory. To the ruins of the bourgeoisie, whose ashes are still warm, we can add the smoking ruins of the urban middle class, and – why not? – those of the future of the proletariat of the first half of the twentieth century (3).
Modernariato, vintage, memorabilia, souvenirs: design objects, jewelry, clothing, school supplies, product labels, films, photographs, books, post- cards from World War II, from the first Peronist government, from the Cuban Revolution, Jovem Guarda, East Germany, the Soviet Union, the Cold War, the conquest of space... Contemporary culture seems to be in constant confrontation with the signs it created, developed, and destroyed in order to perpetuate itself. Repressed, perhaps even forgotten, but still alive, these signs retain, nevertheless, the power to rekindle the ashes and inflame the anxieties of the utopian dream that witnessed their birth.
II.
In the 29th São Paulo Biennial, in 2010, on the first floor, a small space enclosed by two walls contained Rosângela Rennó’s installation Menos-valia [leilão] (Minus-Value [Auction]), consisting of 73 objects, displayed on the walls and on a multi-level table in the center of the room. Cordons separated objects from visitors. Each object had a hole, and through that hole passed a thin chain holding a plaque showing the name of the artist, the name of the installation, a number assigned to the object and the place where it was acquired. A wall label stated that the objects would be auctioned near the end of the 29th Biennial by official auctioneer Aloisio Cravo, a specialist in Brazilian painting.
The artist assembled 73 objects using, as raw material, discarded photographic and filmmaking equipment, bought at the humblest flea markets of two continents. In her wanderings through the fairs of Montevideo, Rio de Janeiro, São Paulo and Lisbon, the tianguis of Mexico, El Rastro in Madrid or the marchés aux puces of Paris, Rosângela Rennó collected cameras, slide carrousels, slide viewers and projectors, stereoscopy devices, magic lanterns, praxinoscopes, microscopes, telescopes, binoculars, lunettes, magnifying glasses, mirrors, jigsaw puzzles, silhouettes, photo albums, portraits, picture frames, and also old photographs.
Underlying the contemporary figure of the wandering artist, drifting be- tween centers and peripheries, there is the modernist image of the rag-picker – the trash collector – also adrift between the center and periphery of the city, collecting the garbage of whoever has garbage to discard of.
To Charles Baudelaire, the paradigm of the artist as hero of modernity unfolds into a proud cohort of the dispossessed: the fencer, the robber, the apache, the rag-picker
has to collect, in the capital, the garbage of every day that passes. All that the big city threw away, all that it lost, all that it despised, all that it destroyed is collected and recorded by him. He compiles the annals of debauchery, the capharnaum of the dregs: he separates things, makes an intelligent selection; proceeds, like a miser with his treasure, and lingers in the wreckage that, between the jaws of the goddess Industry, will take the form of useful and agreeable objects (4).
According to Benjamin, Baudelaire’s terse manner of walking, described by Félix Nadar – “Baudelaire walked his neighborhood and the city in a fitful manner, simultaneously nervous and languid, like a cat, choosing each cobblestone as if to avoid crushing an egg” (5) – would be “the step of a poet who wanders the city in search of rhymes” (6); the walk of a rag-picker, stopping at every moment to select and store discarded objects.
The rag-picker is also a collector: he collects “the annals of debauchery, the capharnaum of the dregs”, the remains of past disasters that float before us, utterly lost. Whatever the rag-picker rescues from this limbo, which is not even a ruin, will be transformed because, unlike the collector, he does not amass for himself, but merely collects and forwards.
With elegance, delicacy and humor, Rosângela Rennó assembled these remnants and transformed them into fetish objects, relics: ambiguous objects that slide from the sacred to the profane, the sublime to the grotesque, from irony to melancholy. Is it not melancholy, the smile that begins to form when we see that camera that we so desired decades ago, cloistered in a glass case that pre- serves it and separates it from us, like a tanagra or a small Egyptian glazed pottery hippo?
In each object, layers of memories overlap; the initial perception is possibly that of the scarce temporality of the thing itself; but, from this information, memories of use begin to grow, of the place of purchase, of the images that nearly always come attached, of the everyday situations in which they were included and, finally – last but not least – of the mnemonic pre- existence of works by the artist herself and by other artists.
The objects of Minus-Value [Auction] activate the memory and, unconsciously, modify it, because the hypothetical first memory is added to the memory of the object evoked. In this process of sub-textuality of “previous mnemonic images” (7) which is not citation, much less pastiche – in the sense of transmission of visual elements – resides the foundation of an artistic tradition.
Facing the installation, one can see that several objects evoke earlier works by Rosângela Rennó, such as Fantastic Realism, Puzzles [man and woman], The Universal Archive, In Oblivionem, Vulgo Series, Red Series, Cartologia, Bibliotheca, Body of Soul, and The Last Photo, to name them in chronological order. Some objects wander through nineteenth century photography, Surrealist photography, journalistic photography, or the voyeurism of pornographic photographs. Over other objects hover allusions to the Bichos of Lygia Clark, a Bólide by Hélio Oiticica – the unforgettable photo of Mosquito da Mangueira with his hands on his chin, looking at Bólide luz 1, apropriação 3, plastiscope, 1966 – and Annette Messager’s photographic groupings. A subtle sense of the ridiculous pervades the perfect objects that Rosângela Rennó assembled with everyday elements of her generation: lamps made using Kodak slide projector carrousels, crowned by shades such as those used in popular architecture of the 1980s, or the television simulacra with middle frame visors, like those that street photographers used to sell at the time. Simple objects that evoke the consumption of lower middle-class images in the evocative kitsch of that decade – not yet entirely lost.
III.
In Montevideo, Uruguay, far from the city center, lies the Museo de la Memoria. It occupies the Quinta de Santos, a summer palace that belonged to Dictator Máximo Santos, who ruled the country between 1882 and 1886. It is a luxurious residence in whose garden there is a small castle that served as a doll house for the dictator’s daughters, a zoo encircled by bars – the infamous leonera (8) –, pavilions for breeding exotic birds, an artificial cave crisscrossed by labyrinthine corridors and illuminated with gaslight, fountains, more fountains, statues, artificial waterfalls.
Though in ruins, this house preserves the memory of recent dictatorships with a collection of residual objects that, in their extreme modesty, seem un- worthy of any display case. Photos abound, often outsized enlargements of small images taken from the underground press; there are a handful of prison uniforms, cell doors, used aluminum pans, a printer used by an underground printing press, some flags and pamphlets. What are most moving, however, what most characterizes that short span of time, are the most insignificant objects, those that, intended for disposal or oblivion, affirm the resistance of Uruguayans during the dictatorship.
DISPLAY CASE 1: ball bearings, lead pellets, a glass bottle with a wick of cloth, nails folded in half and soldered crosswise, handwritten pamphlets, mimeographed newsletters. The caption explains: “Pellets and ammunition used to make horses slip and slide, miguelitos (9), Molotov cocktails, pamphlets and resistance journals.”
DISPLAY CASE 2: Men’s leather belt lying over a diary that reads: “The drama of Castagneto’s mother” and news of the disappearance of activist Hector Castagnetto, kidnapped by paramilitary forces.
DISPLAY CASE 3: A small tin box containing a notebook written in tiny script. The caption reads: “On these leaves the book ‘History of the Vietnamese Communist Party’ was hand copied by Ismael Bassin, Liberty Prison.”
DISPLAY CASE 4: On little silk paper bags, ornaments made by political prisoners are displayed: a cross, a wedding ring, a needle, a bracelet, a signet ring, and several medallions, all carved in bone. There are also small sculptures and bas-reliefs carved on soap bars.
The museographic installation organizes the objects as if they were artworks, giving them an initial interest, far from the coldness of a historical museum. The impression of being outmoded is heightened in the consciousness of those (like me) who experienced this period without ever expecting to see these things elevated to the category of museological object. “Pellets and ammunition to make horses slip and slide, miguelitos, Molotov cocktails, pamphlets and resistance journals.”
There is a strange suspension of values in exhibiting the resistance fighters’ crude weapons – they are not swords, rifles, or machine guns – and, even though we may be aware of the modesty of their effectiveness, questions arise about their possible use in the 21st century. The Molotov cocktail, above all, evokes the specter of a 20th century that refuses to quit.
IV.
In the Memoria Abierta page, a segment called “Vestigios, un ensayo de transmisión a través de los objetos” (10). [Vestiges, an Essay on Transmission through Object] was recently opened. Its organizers propose two fundamental questions: can objects establish relationships between past and present, and can they be used as tools for the transmission of memory:
This proposal aims to investigate the ability of objects to establish relationships between past and present, so that they can be used as vehicles for the transmission of memory while, at the same time, stimulating debate and reflection.
For this purpose, they reveal and include on the page photographs of material things that families and friends of victims of the last military dictatorship retained from those years. Each object is accompanied by a report that identifies and contextualizes it.
Two times vestiges, because they are residue, and because they are photographs; what the page shows are pictures of objects, left behind by the dead combatants, that are cherished by their relatives. These images – family photos, notepads and school books, records, objects made in prison, Peronist memorabilia – hold a personal and affective memory that is often lacking from historical accounts.
V.
In one picture, we see a boy raising a baby under the age of one in the air. The boy is smiling, the child looks frightened. Other pictures unfold: the same young man holding the boy against his chest, and the entire family: mother and father smiling, the baby in their arms.
These pictures were taken at a ranch in San Miguel where my husband, my son and I were underground. My in-laws had also come from Mendoza and were staying with us. A few days before, my brother-in-law had disappeared. We lived in a very simple house; in front there was a grove, and behind another house, where my in-laws lived. It was an area of farms; there were neighbors, and we wanted to give the impression of being a totally normal family. So, we decided to have a family day in which my sister came, her children, etc. All came hidden, so they wouldn’t know where the house was. My sister brought a camera, and we took the opportunity to take lots of pictures. That was in January of 1976; my husband disappeared six months later. This is the only picture I have of us with our son. (11)
The photograph of five stacked picture frames, bought in Mexico City: the one on top shows the portrait of a little boy; the next one allows us to guess the image of a girl; after that the images are covered, and we see only a golden leaf. No one knows who these children are, where they are; we guess, from their clothes, that they probably are no longer alive.
LOT 16
ERASURE BY STACKING
C.D.O. Santa Cruz Street market, Mexico City, Mexico O.C. 37,00
S.B. 130,00
DIMENSIONS 30,5 × 25 × 8 cm DESCRIPTION Five b&w photographs (gelatin silver paper) in five picture frames of different materials, metal and / or gilded wood, overlaid.
MODEL II: OF MINUS-VALUE AND SURPLUS-VALUE
I.
“Minus-value”: the Houaiss dictionary tells us that the term “minus- value” is a feminine noun used in the Portuguese language since at least 1971. It belongs to the vocabulary of economics and means “the difference between the net book value of an asset and its market value when the latter is less than the former” (12). Its etymology indicates translation of the French “moins-value”, which entered the dictionary in 1765: “decrease in the value of an object, loss of value, difference between real and theoretical product (for a fee, a tax)” (13) formed in opposition to the French “plus-value or “surplus-value.” In www. thinkfn.com, we are told that an investor, often for tax reasons, will sell a losing investment in order to realize his loss so that he can offset other realized gains; in other words: “The realized minus-values offset the realized surplus- values in the same fiscal period for tax purposes” (14).
In Spanish, we find the written word “minusvalía” meaning: “1. Decline in value of an object, or accounting asset, at two different times. 2. Decrease in a person’s physical or mental capacity” (15). The second meaning is commonly used in psychological contexts, in legal theory, even in police jargon, to convey disability, diminished capacity, and even inferiority complex, a meaning that includes, among its symptoms, the feelings of failure, inadequacy, and impotence.
Rosângela Rennó’s Minus-Value [Auction] glides between these meanings, a wound that will not heal between monetary operations and the intimate place of failed sentiments and lost affections. The artist’s perverse strategy of transmuting the decadent value of the discarded object into the potent value of the artwork, legitimized by institution and market, allows us to instantly glimpse, in these objects, the strong pulse of a force driven to deny loss and failure.
On the ruins of modernity, on the rubble of the utopian future, obsolete technologies and lost images appear to be infinitely more eloquent than the interminable and empty stream that inundates us with perfect images. The inability to rescue one single image from this endless torrent of desires, and the nostalgia for a time before destruction, provoke melancholia, but a melancholia that detaches itself increasingly from the lost object.
II.
In 2008, Damien Hirst decided to bypass his agents (Jay Joplin, of White Cube in London, and Larry Gagosian, in New York) and hold an auction of his works at Sotheby’s in London. The artist focused his activity on marketing the event, and invited important collectors, like the fashion designer Miuccia Prada, the Ukrainian businessman Victor Pinchuk, and the owner of auction house Christie’s, François Pinault, to his studio in Gloucestershire for private visits prior to the works’ display. Sotheby’s, in turn, made available their entire London gallery space and reinforced surveillance during the public viewing.
The exhibition, called Beautiful Inside My Head Forever, consists of variations on the artist’s familiar themes. An abundance of animals in formaldehyde tanks, glass cabinets filled with anything from diamonds to cigarette butts, paintings and works on paper that exhibit his particularities – skulls, spots, spin kaleidoscopes and moths –, available in all sizes. The auction coincided with a financial market crisis, appearing to signal that art was a safe haven for large fortunes.
It is well-known, by all collectors, that Hirst “does not paint his triumphantly empty spot paintings – the best spot paintings by Damien Hirst are those painted by Rachel Howard”, says Germaine Greer, an art critic for The Guardian, adding: “Damien Hirst is a brand, because the art form of the 21st century is marketing” (16).
In the same text, Greer contests Robert Hughes’s claim that there is no biblical resonance in the Golden Calf, a key work in the exhibition. For her, the dead calf would be, in reality, a legitimate descendant of the biblical idol, an idol that worships the power of material wealth; because, as she believes, neither the calf, nor any of the other works, are the artwork: “Bob dear, the Sotheby’s auction was the work” (17).
III.
Invited to show the work Matter of Poetry at the 29th São Paulo Biennial – which, under the title There Is Always a Cup of Sea to Sail in, intended to analyze the relationship between art and politics in contemporary art – Rosângela Rennó also proposed to curator Moacir dos Anjos that an auction of her works be held during the final days of the exhibit, in December, 2010.
The work Minus-Value [Auction] had already been presented – as a test run, with the Spanish title of Menos- valia [Subasta] – at the Museo Universitario de Arte Contemporáneo (Muac) of the Universidad Nacional Autónoma de México (Unam), as part of Jardín de Academus, an event organized and curated by Mexican artist José Miguel González Casanova.
This first auction, held in May, 2010, investigated the possibilities of assigning legitimized exhibition value to objects purchased in the tianguis of Mexico City. The lots included various other objects, not just those related to the field of imaging technique; what all had in common was having been acquired at humble second-hand markets and, perhaps, a certain affectionately kitsch appearance. On the museum wall, and on the red velvet exhibition table, there were children’s toys, knick knacks, glass jars; also picture frames, stereoscopic viewers, and framed photographs.
The auction was held on December 9, 2010, in the Biennial pavilion, after closing time, on the mezzanine, in an area adjacent to the cafeteria, whose chairs were used for seating. Auctioneer Aloisio Cravo climbed a small podium with an acrylic lectern and conducted the auction from there, showing the lots on a portable projection screen. Among the potential buyers were collectors like José Olympio Pereira, Dudu Linhares, Oswaldo Corrêa da Costa, and Bruno Musatti, as well as curators like Moacir dos Anjos, Marcelo Araújo, and Adriano Pedrosa.
In the catalogue, available in pdf format, each lot was identified by serial number. Also specified was the location where the objects were purchased (C.D.O.), the object cost (O.C.), the starting bid (S.B.), the hammer price (H.B.) the materials used, and the final dimensions.
LOT 24
CARTES DE VISITE WITH ENLARGERS
C.D.O. Santa Martha street market, Mexico City, Mexico
O.C. 30,00
S.B. 150,00
DIMENSIONS 20 × 30 × 3,5 cm
DESCRIPTION Two frames containing three b&w portraits (gelatin silver paper) chosen by the artist from a set of photographs from Mexico.
The auctioneer pointed out several times during his presentation that he had never heard of an auction of lots from a single artist in Brazil, much less one of lots belonging entirely to the same installation, one that had been shown at the country’s most important art event, the São Paulo Biennial.
All lots were bid and sold in an atmosphere of great excitement (there was none of the mute tension seen at Christie’s or Sotheby’s). Auctioneer Aloisio Cravo announced that the works could be picked up starting December 13 at his office, and that his customary 5% fee should be added to the hammer prices. The Biennial was to end two days later, but the installation was dismantled the day after the auction. At that point, the work became complete. Its function, in the 29th São Paulo Biennial, had come to an end, and the space formerly occupied by its objects was deliberately left empty.
From the beginning of the work, when Rosângela Rennó and her friends purchased photographic objects in the street markets of various countries, until the moment when each collector left the auction house, their purchases carefully packed, nameplate and certificate of authenticity enclosed, a performance process took place about which many of those involved were unaware.
Because, as Greer said about the Hirst auction, the auction was the work. And the work looked a lot like life: the artist created, friends helped, assistants assisted, curators curated, the Biennial Foundation authorized, the auctioneer auctioned, collectors bought, and critics, as usual, did not critique. Like in a frightening display of déjà-vu in which, at every turn, the perceived and the remembered overlap and separate simultaneously, every- thing went according to script. Aloisio Cravo’s words, “there is no previous record, in Brazil, of an auction made up entirely of lots from the same artist”, were simultaneously true and false, because what nobody had seen before was the combined presence of collectors, curators and artists, inadvertently transformed into actors involved in an act; moreover, actors who performed their roles to perfection, despite the absence of a script.
Minus-Value [Auction] also exposes much of what the São Paulo Biennial conceals or subtracts. In the introductory text of the catalogue, the curators say that they avoided the model commonly found in contemporary art shows: “a model linked exclusively to the hurried demands of market and spectacle, marked by an anxious search for the allegedly unprecedented” (18). Rosângela Rennó, however, managed to bring the most radical expression of market avidity into Oscar Niemeyer’s pristine open spans.
We all know that the contemporary art market dominates the general art market and that, in recent years, the most spectacular sales have happened at auctions; in other words, in the traditional secondary market, where the criteria of taste, artistic value, and temporality are tested, and where the monetary value of the artist’s work is confirmed or questioned (19).
What would be the point of presenting Minus-Value [Auction] at the São Paulo Biennial? An auction that is, at the same time, an artistic undertaking – I hesitate to use the word performance because it retains the initial meaning of representation – and a real auction?
In her introductory text, the artist declares that:
These objects undergo successive aggregations of material and symbolic value on their way to their final destination, to be determined on December 9th, 2010, when each will be auctioned in the pavilion of the Biennial itself. Upon purchasing an object, the buyer will receive a certificate of part owner ship in the project Minus-Value [Auction] and will be able to include it in his art collection.
In the field of ideas, Minus-Value [Auction] can also be understood as one of the contemporary practices most strongly linked to current theories of Ruinology, resembling “active recuperation transformation”, among others recently consolidated (20)
In the first paragraph, the author points out that the buyer of an object buys only part of the project. She maintains, openly, that the project remains hers and that, therefore, it will not belong, in its totality, to any art collection. Tongue-in-cheek, the artist alludes to a new discipline, “ruinology,” and one of its branches, that of “active recuperation transformation”.
Contemporary artists, like the Cuban Carlos Garaicoa, are laden with this melancholy feeling evoked by ruins; in his case, the unfinished and abandoned buildings of Havana, after the decline of European socialism. The ruins of the utopian project – not the ruins of a luminous past, but of a future that did not happen – are evoked by Garaicoa as “ruins of the future”.
Garaicoa’s paradox – which seems to allude to Cuban poet Nicolás Guillén’s quip upon first setting eyes on Brasilia: “I behold, astonished, the ruins of the future” – shifts, to the future, the notion of ruin, something heretofore understood as a remnant of the past.
In the Renaissance, the architectural remains of ancient civilizations acquired the status of witnesses, still living, of more glorious times. Earlier objects and their fragments, without meaning or function, were invested with the aesthetic, political or historical values of the present. Ruins disturb because they announce the imminent loss of meaning that threatens every human work; but this failure of significance transforms itself into a vertiginous discursive proliferation. Rosângela Rennó’s ruins are remnants of a relatively recent past, of a modern life that still seems to exist and flourish, though increasingly degraded, in the poorer neighborhoods of our opulent cities. What moves the artist is a melancholy feeling, one that does not rejoice in the lost but accepts it, and renders it productive.
Rosângela Rennó’s objects raise questions about their origins; they are sites for reflection strategies that can tell us more about those who look than about what is being looked at.
By sarcastically naming the operation “minus-value,” Rosângela Rennó appears to conceal the unavoidable power of value added:
LOT 20
POLAROID BICHO
C.D.O. Santa Martha Street market, Mexico City, Mexico
O.C. 85,00
S.B. 170,00
DIMENSIONS 18×30×11 cm
DESCRIPTION Two identical Polaroid Sx 70 Land cameras, joined together. One was purchased in Rio de Janeiro and the other in Mexico.
In this lot, the two Polaroid cameras cost R$ 85,00; after adding the cost of labor, the adhesive tape, and the acrylic plate and chain, the initial bid was set at R$ 170,00. The price realized at the auction came to almost four hundred times this value. The exhibition at the Biennial, the unprecedented auction, the prestige of Rosângela Rennó in the international art system, a timely allusion to Lygia Clark’s Bichos, and even a degree of visual kinship with some of them, not necessarily in that order, increased the value added to the object.
But can one still talk about added value in the complex context of the market for sumptuary objects (unique, rare, exclusive), including art objects? This field is regulated by a particular relationship of supply and demand, since the monetary value that such objects attain depends almost exclusively on their symbolic value, associated with exclusiveness, on the desire to possess them, and the sub- sequent prestige, attached to the ability to purchase and display them.
Rosângela Rennó reveals and presents market mechanisms, in an exhibition characterized by works that, according to the curator, do not obey “the hasty demands of the market and of spectacle” (21). Other works present in the same Biennial fulfill this intention, works from the 1960s and 1970s, like Tucumán arde, La familia obrera, the actions of Grupo Cada, or Artur Barrio’s situations, ephemeral works of which only contemporaneous records remain.
The manner in which Minus-Value [Auction] was shown was appropriate to the market: a display of objects that would be (and were) acquired by the highest bidder. This strategy of exhibition shows the audience (but, what audience?) how cultural industry leftovers can be raised to the category of art- works. The artist declares, through her installation and subsequent action, that, by losing its functional value, ordinary and insignificant things can achieve not only a powerful and enduring character but also, by means of the legitimacy granted by the institution of art, an elevated monetary value.
CODA
The significance of insignificances is entirely concentrated in the evocative charge that these objects manage to conserve, in their displays, inside their boxes, outside the auction. Lot 72, My Life through Portraits, purchased in the Rio de Janeiro Praça XV flea market, contains, in a simple black frame, “an album without a cover, very complete, about a singular woman” (22). What we see, through the glass, is exactly that, and only that: a coverless album, the first page quite tattered, its leaves tied with a bright ribbon of synthetic material. The only visible page shows three photographs: in one we see a little girl standing on a chair; in another, two girls with big bows in their hair: one sitting, the other standing on the same bench, holding a doll by the leg. The photograph of a young lady – the singular woman? – at the beach, one foot poised over a ball, overlaps the other two in the center of the page. If the photos are of the same woman, more than ten years must have passed between the first and the last. On the gray paper of the old album there are different handwritings: “My Life through Pictures” appears on the page header, written in an ornate calligraphy. Under the photo of the girl, written in a different hand, there is “Españ (R”, the rest of the caption is hidden by the picture of the young lady. Below the picture of the two girls, the same hand wrote “Brazil (Rio de Janeiro) 3 años”; but the singular woman corrected the caption and added, in ink of a different color, “/ 4” next to the number 3. The picture of the slender young lady at the beach was overexposed, so that her body, from the waist up, is blurred by sunlight.
Here are the clues for a story that begins in Spain (Restabal, Riaño, Rioja, Rioscuro, Rodalquilar,?) and continues in Rio de Janeiro; these are the clues to begin to imagine the hands that put together the album that began in Spanish and continued in Portuguese: female hands, no doubt, affectionate hands. In Minus-Value [Auction] the album is no longer about the life of a singular woman, but about the singular life of many immigrant women. The remains of a life that could well end up in the trash, or in the flea market at praça xv, are now redirected to a collection, after passing through the halls of the 29th São Paulo Biennial.
Baudelaire’s rag-picker, again, overlaps the image the artist; Rosângela Rennó, bringing together images and objects that have lost all use value and nearly all exchange value, recombines them, makes them unique, and delivers them to another sector of the market. The strategy that operates in the construction of Minus-Value [Auction] – recollection, assembly, exhibition, auction, and dispersion – exposes the mechanisms of production and alienation of cultural goods.
In this never-ending process – between melancholy and cynicism – Rosângela Rennó proposes precious enigmas and obscene do it yourself kits for us to assemble.
- Walter Benjamin, “Surrealism: The Latest Snapshot of the European Intelligentsia”, in One- way Street and Other Writings. London: Penguin Classics, 2009, p. 148.
- Id., ibid., p. 148.
- Cf. Hal Foster, “This Funeral Is for the Wrong Corpse”, in Design & Crime. London: Verso,2002, p.139.
- Charles Baudelaire apud W. Benjamin, Obras escolhidas iii: Charles Baudelaire, um lírico no auge do capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 1989, p. 79.
- Firmin Maillard, La Cité des intellectuels, Paris, 1905, p. 362. Apud W. Benjamin, Passagens. Belo Horizonte: UFMG, 2006, p. 227.
- W. Benjamin, Obras escolhidas iii: Charles Baudelaire, um lírico no auge do capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 1989, p. 79.
- 7 H. Foster, op. cit, p. 67.
- A moat where the dictator raised lions and, it was said, threw his opponents.
- “Miguelito” was the popular River Plate name for large nails bent in half and soldered cross-wise, strewn in the streets to puncture police car tires.
- <www.memoriaabierta.org.ar/vestigios>.
- <www.memoriaabierta.org.ar/vestigios/objeto.php?id=81>.
- Dicionário Eletrônico Houaiss.
- Id., ibid.
- <www.thinkfn.com/wikibolsa/Menos-valia>.
- Pequeño Larousse Ilustrado.
- Germaine Greer, “Note to Robert Hughes: Bob, dear, Damien Hirst is just one of many artists you don’t get”. The Guardian, 9 / 22 / 2008.
- Id., ibid.
- 29a. Bienal de São Paulo (catálogo). São Paulo: Fundação Bienal, 2010, p. 21
- Terry Smith, What is Contemporary Art? Chicago: The University of Chicago Press, 2009, p. 119.
- Presentation text for Minus-Value [Auction] by Rosângela Rennó. Wall text for 29th São Paulo Biennial.
- 29a. Bienal de São Paulo (catalogue). São Paulo: Fundação Bienal, 2010. p. 21.
- Online catalogue of Minus-Value [Auction].
MELENDI, Maria Angélica. Do it yourself kits. In RENNÓ, ROSÂNGELA. Menos-valia [leilão]: Rosângela Rennó. São paulo: Cosac Naify, 2012, pp. 228-265.