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Três esquivas rumo ao arquivo de Rosângela Rennó (1)



Three Side Steps to Rosângela Rennó’s Archive (1)


    DE CERTO MODO FAMILIAR 

    E foi assim que os cristãos,
    duros e pequenos
    como pregos de ferro, e reluzentes, como armaduras a ranger, encontraram uma cena que já era
    de certo modo familiar:
    nem alamedas suaves, caramanchões, cerejeiras carregadas nem alaúdes, mas assim mesmo algo que lembrava um sonho antigo de riqueza e luxo
    já saindo de moda lá na Europa - riqueza, e mais um prazer
    novinho em folha. 

    Elizabeth Bishop (2) 

    Na virada do século XIX para o XX, o viajante e médico francês Victor Segalen escreveu extensamente sobre o exotismo como um repositório de diferenças culturais moldadas pelo tempo e espaço. Segalen propunha um encontro poético com o Outro que buscasse expandir as fronteiras da imaginação em vez de impor um sistema hierárquico de conhecimento (3). Muitas vezes desprezado no mundo moderno como busca de entrete- nimento acessível, porém superficial, o turismo se mostra o lado B do exotismo. A artista Rosângela Rennó, por meio de sua exploração do turismo em um vídeo monocanal onde as ondas do mar lavam a superfície plana de uma praia vazia, na qual uma mão escreve algumas palavras em língua indígena, nos reconduz ao choque entre temporalidades sociais, visibilizando uma lacuna entre as ficções etnográficas e o olhar exótico. A água espumante apaga as palavras lentamente escritas na areia com um pedaço de madeira pontiagudo, enquanto ouvimos o murmúrio suave do oceano misturar-se com o som imaculado de um chilrear. Rennó deu à sua série o título Turista transcendental (2006-2016), a qual pertence o vídeo Método básico de assovio gomero-tupi (2014-2016). A obra foi inspirada por um episódio da vida do santo sacerdote espanhol José de Anchieta, que viajou ao Brasil em uma missão jesuíta portuguesa. O sacerdote é famoso por ter escrito a Arte da gramática da língua mais falada na costa do Brasil (1595), a primeira gramática da língua tupi produzida no Ocidente. Nascido nas Ilhas Canárias, Padre Anchieta zelosamente ensinou a religião católica aos Tupi por meio de poesias, recusando impor aos autóctones as lições mais invasivas e violentas da religião monoteísta ocidental. 

    A despretensiosa meditação de Rennó sobre a memória colonial brasileira nos recorda as ruminações de Sigmund Freud sobre o Wunderblock (o bloco mágico), que o pensador vienense descreveu como: “uma tabuinha feita de resina ou cera marrom-escura, com margens de papelão, sobre a qual há uma folha fina e translúcida, presa à tabuinha de cera na parte superior e livre na parte inferior” (4). O Wunderblock é um brinquedo infantil do século XX que tem a função de auxiliar a memória, e representa, de acordo com o fundador da psicanálise, “um retorno a como os antigos escreviam, em tabuinhas de argila e de cera. Um estilete pontiagudo arranha a superfície, e os sulcos assim deixados vêm constituir a ‘escrita’” (5). Embora o Wunderblock visasse criar um jogo neurótico de escrever e apagar, Freud também observou que sua placa de cera guardava as memórias ocultas dos escritos apagados, assim como ocorre nas impressões que se formam em nosso aparato mental e seu tecido insondável (o inconsciente). No objetivo Método básico de assovio gomero-tupi de Rennó, a tela é posicionada verticalmente, estabelecendo uma analogia ainda mais próxima com o Wunderblock. A areia e o oceano encarnam metáforas tropicais da viagem colonial da Europa à América do Sul, cuja memória traumática é reencenada pela artista através do mito do sacerdote que obstinadamente escreveu 5000 versos na areia devido à falta de papel e tinta: “podia então ser visto na praia escrevendo e reescrevendo”, comenta Rennó em sua sinopse da obra (6). 

    HISTÓRIAS DA FOTOGRAFIA 

    Sim, mas o que é, no fundo, a história? Malraux: Todos nós sentíamos que a aposta pertencia a um campo mais profundo que o político. Braudel: Que se meça a multidão dos que negam sua miséria. O número de corações que querem ser eles mesmos e, apesar de tudo, viver suas vidas. Como se fôssemos mestres de nossa própria vida. Como se esta estivesse à nossa disposição. E aquela maldita frase de Cioran: Nosso conhecimento não nos exime da expiação. Cedo ou tarde, pagamos caro por qualquer pensamento ousado ou indiscrição do espírito. E o jovem Péguy: Ah, a história! Uma fidelidade inquestionável às coisas há muito desaparecidas. O que sempre acontece, amigo? Cai a tarde. Terminam as férias. Preciso de um dia para escrever a história de um segundo; um ano para escrever a história de um minuto; uma vida para escrever a história de uma hora; e uma eternidade para escrever a história de um dia. Uma pessoa pode escrever qualquer história, exceto a sua própria. 

    Jean-Luc Godard (7)

    Em seus hiatos temporais, a obra de Rennó se baseia na história da fotografia e nela se enquadra. A artista desenvolveu sua poética na década de 1980, quando essa narrativa adquiriu uma perspectiva plural; ou seja, as histórias da fotografia. Paradoxalmente, a técnica conquistou o direito de figurar nos acervos dos museus apenas quando as imagens fotográficas começaram a ser interpretadas, apropriadas, reconfiguradas e questionadas por artistas do mundo inteiro, desde o sul global até o norte assolador, no final do século XX. 

    O mais importante é que a fotografia, considerada demasiado contingente, revelava tanto a disfuncionalidade quanto o descontentamento ideológico resumidos pela arte moderna, propondo um modelo historiográfico alternativo capaz de empreender uma ação descentralizada; era “demasiado limitada pelo mundo fotografado, demasiado dependente das estruturas discursivas nas quais estava inserida” para se tornar autônoma em termos modernistas (8). Por meio da fotografia, o olhar etnográfico foi produzido e amplamente disseminado a partir do final do século XIX. Um século depois, esse olhar foi desmontado, ou pelo menos descontruído, por etnógrafos, antropólogos e artistas que evidenciaram as fissuras do cânone ocidental em sua tentativa de criar uma iniciativa conjunta entre a tela da percepção e a realidade. 

    Ao contrário de muitos fotógrafos latino-americanos, que ao final da Guerra Fria ainda estavam ocupados em garantir a sobrevida das práticas documentárias já em declínio, o investimento crítico de Rennó na contestação dos princípios da imagem fotográfica levou-a a explorar novas possibilidades hermenêuticas para o suporte (9). Das provas documentais aos registros de arquivo, a abordagem fotográfica livre e multidimensional de Rennó destila, em maior medida, os debates fundamentais que moldaram um campo no qual vozes importantes, como as de Martha Rosler (1943) e, ainda antes, dos cineastas colombianos Luis Ospina (1949-2019) e Carlos Mayolo (1945-2007), questionavam diretamente o mito da objetividade jornalística em suas fotografias e documentários cinematográficos (10). O caminho de apropriação fotográfica seguido por Rennó, sua noção tática do arquivo como uma fonte preciosa para reposicionar os heróis anônimos da inconsciência óptica, furtava-se a retórica moral do gênero documentário na busca por permutações formais e conceituais ligadas à realidade. Seu momento decisivo visa revelar as armadilhas do discurso social disfuncional de um suporte construído sob a lógica do modernismo. Desde os retratos em tamanho real dos trabalhadores que construíram Brasília na sua monumental instalação Imemorial (1994) até a mais recente Operação Aranhas/Arapongas/Arapucas (2014- 2018), os rearranjos fotográficos de Rennó abordam a passagem da reprodução mecânica benjaminiana para a liquidez da era digital (11). 

    A linha de raciocínio desconstrutiva por trás de Operação Aranhas/ Arapongas/Arapucas - que compreende treze trípticos, cada um montado a partir de fotografias tiradas por três fotógrafos brasileiros (entre os quais a própria artista) em momentos e eventos específicos - é a da temporalidade das imagens. Treze fotos foram tiradas por José Inacio Parente (1942) na Passeata dos Cem Mil, realizada no Rio de Janeiro em 26 de junho de 1968. Outras treze foram tiradas por Rennó no Comício das Diretas Já, em Belo Horizonte, dia 24 de fevereiro de 1984. As últimas treze imagens foram capturadas pela Cia de Foto no Movimento Passe Livre em São Paulo, em 17 e 20 de junho de 2013. Todas as fotos registram importantes manifestações políticas no Brasil desde a época da ditadura civil-militar, e que, segundo a artista, “se parecem”. Rennó explica sua estratégia: “Para cada evento, escolho um padrão específico de papel de seda estampado - aquele tipo tradicional de papel que intercalava as páginas dos antigos álbuns de fotografias. Pode-se reconhecer cada um dos três eventos pela diferença nos padrões do papel de seda. Lentes e filtros fotográficos nos permitem vislumbrar rostos na multidão, em referência ao método usado pelos informantes da polícia militar (chamados ‘arapongas’) para identificar, nas fotos de manifestações ou de grupos de manifestantes, aqueles indivíduos considerados subversivos pela ditadura brasileira.” (12) Se retornarmos à série Cicatriz (1996) - uma instalação emblemática composta por dezoito fotos de arquivo em preto e branco de detentos tatuados, exibidas com textos jornalísticos de diversas fontes -, encontraremos um relato historiográfico alternativo àquele comumente empregado pelas chamadas ciências sociais e humanas. 

    A obra de Rennó mobiliza as complexidades, desafios e opacidades éticas da economia molecular da distribuição de bens e serviços, uma ordem disjuntiva produzida pelo modelo desterritorializado do capitalismo tardio. Tal modelo deixou à mostra a ponta de um iceberg político em processo de dissolução, mais visivelmente presente após o tumulto desencadeado pelo caso das redes de corrupção da Odebrecht, o qual também criou uma reação em cadeia de instabilidade política na região sul-americana, alavancando forças autoritárias de vários tipos. No Peru, por exemplo, quatro ex-presidentes se viram implicados no sistema de propinas da empresa, e um deles cometeu suicídio. O enquadramento proporcionado pelas histórias da fotografia abrange uma construção de narrativas político-poéticas mais amplas que, como o deus Jano, tem duas faces: são mitos e ficções e, ao mesmo tempo, fatos objetivos semi-construídos - pois encontram-se em um processo perpétuo de construção. 

    Rennó utiliza imagens de arquivo de três marcos históricos do movimento pelos direitos civis no Brasil, desde os anos de chumbo até os tempos atuais, para desfazer a lógica fotográfica da imunização. Seu engajamento conceitual com as histórias da fotografia resume todo um conjunto de instalações, livros de artista, filmes, fotos impressas e gravuras. Mais importante ainda, essa obra monumental também evidencia os modos pelos quais as imagens processadas refletem a transição do etos da vanguarda brasileira para a era (pós-)ditatorial. A exploração que Rennó faz de diferentes formas de apresentação reflete sobre a função parasitária das imagens dentro dos circuitos ideológicos de apropriação, que atuam em conjunto com métodos inovadores de produção artística resultantes das definições de histórias locais da arte, da pintura e das práticas cinematográficas experimentais. Assim, as histórias da fotografia - no plural - podem eventualmente reverter a pulsão de morte freudiana. (13) 

    A VIDA DEPOIS DAS IMAGENS 

    Não há arquivo sem um local de armazenamento, sem uma técnica de repetição e sem uma certa exterioridade. Não há arquivo que não tenha um lado de fora. 

    Jacques Derrida (14) 

    Existe vida depois das imagens? As imagens resistem à destruição? Essas perguntas ousadas parecem ter perdido força após um ano de confinamento mediado pelo mundo digital, período em que as telas dominaram e ainda dominam nossa vida cotidiana ameaçada pela febre pandêmica. Desde o surgimento da internet, a onipresença das imagens aumentou exponencialmente e elas passaram a viajar à velocidade da luz. As imagens são a própria realização da profecia do futurismo. 

    Antes do lockdown imposto pela COVID-19, Rosângela Rennó havia sido convidada para participar do “Artist Meets Archive”, um programa de residência artística localizado em Colônia, Alemanha, como parte da Internationale Photoszene Köln. Estava programado para 2020, quando ela pesquisaria no Stiftung Rheinisch- -Westfälisches Wirtschaftsarchiv zu Köln, o Arquivo da Fundação Econômica do Reno-Vestefália, em Colônia (RWWA). Embora seus planos originais tenham mudado radicalmente em razão da pandemia, ela expôs um projeto parcialmente baseado nos arquivos da RWWA no Museum für Angewandte Kunst (MAKK), o Museu de Artes Aplicadas, entre 21 de maio e 5 de julho de 2021. Confinada em casa no Brasil, Rennó pesquisou remotamente para retraçar as origens e histórias da água de Colônia, “inventada” na cidade alemã de mesmo nome. A artista montou Eaux des Colonies [Águas das colônias] (2020-2021), uma extensa linha do tempo, sem final definido, alocada em uma longa parede da galeria, expondo como a invenção do perfume foi contestada, apropriada e se tornou motivo tanto de guerras comerciais como de antagonismos nacionalistas ou regionais. A linha do tempo foi acompanhada por uma instalação feita de de jarros e garrafas de vidro parcialmente preenchidos com álcool, representando todos os países que foram colonizados em algum momento de suas histórias. Rennó declarou: 

    Quando os documentos se tornam imagens e são acessíveis por meio da internet, experimentamos uma espécie de efeito de equalização da informação. Para o bem ou para o mal. Arquivos históricos, blogs de história, as histórias de perfumes em sites de vendas, tudo junto... parece uma atualização do conceito do “museu imaginário”, criado por André Malraux. Esse efeito é perverso e parece ter se consolidado de uma vez por todas (15).

    O que a artista identifica como a “equalização dos efeitos da informação” é, na verdade, um paradoxo definidor geralmente aplicado à fotografia. Nesse sentido, a observação de Thierry de Duve sobre o contexto sempre arbitrário da imagem pode ser útil para provar que o topos do arquivo não é o da web (embora opere dentro de seus limites): 

    A fotografia costuma ser vista de duas maneiras: como um evento, mas nesse caso um evento estranho, uma gestalt congelada que comunica muito pouco, ou quase nada, a fluidez das coisas que ocorrem na vida real; ou é tida como imagem, como uma repre- sentação autônoma que pode, com efeito, ser emoldurada e pendurada na parede, mas que depois curiosa- mente deixa de se referir ao evento particular do qual foi retirada (16). 

    Além da descontextualização das imagens em relação aos eventos a que se referem, a divulgação e circulação da imagem de um documento particular na web deixa de residir em um lugar determinado ou a ele pertencer. Seu conteúdo também se separa de seu significado. 

    Como Rennó acertadamente observou, a falta de um local de armazenamento condena o documento à desintegração e ao esquecimento virtual. Jacques Derrida, que escreveu sobre o tema quando do surgimento da internet, afirmou que os arquivos só existem quando domiciliados, pois isso marca a passagem do privado para o público. Um corpo de conhecimentos fragmentados em imagens e discursos requer a estabilidade hermenêutica de um lugar onde possa ser abrigado e escondido sob uma autoridade que forneça uma identidade, uma unidade e, em última instância, uma classificação aos documentos, para eventualmente transformá-los em arquivo (17). 

    Apesar das dificuldades devidas às restrições de viagens e pesquisa impostas pela pandemia, a autorrefencialidade do projeto Eaux des colonies, bem como suas fronteiras que se estendem para além de uma genealogia, compromete-se a proporcionar algum fundamento à questão do arquivo em tempos de peste, quando o corpo e seus sentidos são atacados pela COVID-19. 
    1. A autora agradece a Ana Maria Maia e a Rosângela Rennó pela generosa ajuda; agradece também a Diana Flatto e Angelina Jaffe. Luiz Vieira merece um agradecimento por suas recomendações editoriais. 
    2. BISHOP, Elizabeth. “Brazil, ‘January 1’, 1502”. In: Poemas escolhidos de Elizabeth Bishop. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, pp. 222 e 224. 
    3. SEGALEN, Victor. Ensayo sobre el exotismo. Una estética de lo diverso. Tradução para o espanhol de Jorge Ferreiro. México: Fondo de Cultura Económica, 1989. 
    4. FREUD, Sigmund. “Nota sobre o bloco mágico” In: Obras completas, volume 16. São Paulo: Companhia das Letras, 2011, p. 244. 
    5. Como assinala Freud, no caso do bloco de notas místico, “o estilete não age diretamente na cera, mas sim através da folha que a cobre (...).” Op. cit., p. 244. 
    6. RENNÓ, Rosângela. “Turista transcendental.” In: Espírito de Tudo: Rosângela Rennó (ed. Evangelina Seller). Rio de Janeiro: Cobogó, 2017, pp. 80-81. 
    7. Transcrito do vídeo Histoire(s) du cinéma [Histórias do Cinema] (1980-1998). Tradução nossa. 
    8. CRIMP, Douglas. “The Museum’s Old / The Library’s New Subject”. In: BOLTON, Richard (org.). The Contest of Meaning. Cambridge, MA: MIT Press, 1992, p. 8, tradução nossa. 
    9. Ver WATRISS, W. Image and Memory. Austin: Fotofest University of Texas Press, 1994. As exceções também fazem a regra, pois podemos encontrar vozes críticas nas obras de Milagros de La Torre, Leandro Katz, Alexander Apóstol e Victoria Cabezas. 
    10. ROESLER, Martha. “Around and Afterthoughts
      (on documentary photography)”. In: BOLTON, Richard (org.). The Contest of Meaning, op. cit.,
      p. 303. Rosler formulou uma elaborada crítica neomarxista às bases exploratórias do que definiu como meta liberal da fotografia documentária e do fotojornalismo. Os cineastas Luis Ospina e Carlos Mayolo, por sua vez, cunharam o termo “miséria pornográfica” em uma declaração na qual reivindicavam o direito de autorrefletir seu contexto em termos do exame de suas diferentes temporalidades, em vez de mostrar os clichês de pobreza e depravação usados como mise-en-images para vender a miséria do Terceiro Mundo. Trabalhando em Cáli, Colômbia, Ospina e Mayolo fizeram uma importante contribuição à teoria pós- colonial do cinema. Ver FAGUET, Michelle. “What is Poverty Porn?” In: RANGEL, Gabriela (org.). Blind Spots, SITAC VIII. Cidade do México: PAC, 2011. 
    11. Ver BENJAMIN, Walter. “The Work of Art in the Age of its Technological Reproducibility. Second Version” (1936). Traduzido para o inglês por Edmund Jephcott e Harry Zohn. In: The Work of Art in the Age of its Technological Reproducibility, and Other Writings on Media. Michael W.
      Jennings, Brigid Doherty e Thomas Y. Levin (orgs.). Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 2008, pp. 19-55. 
    12. Correspondência com a artista, julho de 2021. 
    13. Ver FREUD, Sigmund. Civilization and Its Discontents (1930). Nova York: W. W. Norton & Company, 2010. 
    14. DERRIDA, Jacques e PRENOWITZ, Eric. “Archive Fever: A Freudian Impression.” Diacritics 25, no. 2 (1995): pp. 9-63. Acessado em 25 de julho de 2021. doi:10.2307/465144. Tradução nossa. 
    15. Rennó não pôde realizar a pesquisa em campo devido às restrições de viagens impostas pela pandemia. A citação foi enviada por ela. 
    16. DUVE, Thierry de. “Time Exposure and Snapshot: The Photograph as Paradox”, October, n. 5, 1978, pp. 113-125, tradução nossa. 
    17. DERRIDA, Jacques e PRENOWITZ, Eric. “Archive Fever: A Freudian Impression.” Diacritics 25, n. 2 (1995), pp. 9-63. Acessado em 22 de julho de 2021. doi:10.2307/465144. 



    RANGEL. Gabriela. Três esquivas rumo ao arquivo de Rosângela Rennó. In Rosângela Rennó: pequena ecologia da imagem. São Paulo: Pinacoteca de São Paulo, 2021, pp. 117-127.

    NOT UNFAMILIAR 

    Just so the Christians, hard as nails,
    tiny as nails, and glinting,
    In creaking armor, came and found it all, Not unfamiliar;
    No lovers’ walk, no bowers,
    No cherries to be picked, no lute music, But corresponding, nevertheless,
    to an old dream of wealth and luxury already out of style when they
    left home-
    wealth plus a brand-new pleasure 

    Elizabeth Bishop (2) 

    At the turn of the century from the 19th to the 20th, Victor Segalen, a French traveler and physician, wrote extensively on exoticism as a repository of cultural difference shaped by time and space. Segalen proposed a poetic encounter with the Other that sought to expand the boundaries of the imagination rather than imposing a hierarchical system of knowledge (3). Often despised as an affordable yet superficial pursuit of entertainment of the modern world, tourism seems to be the B-side of exoticism. Artist Rosângela Rennó, through an exploration on tourism in a single-channel video, in which sea waves wash the flat surface of an empty beach where a hand writes a few words in an indigenous language, brings us back to the clash of social temporalities, making visible a breach between ethnographic fictions and the exotic gaze. The foamy water erases the words that were slowly written on the sand with a sharpened wood stick while we listen to the soft rumor of the ocean mixed with the pristine sound of a chirping bird. Rennó named her series Turista transcendental [Transcendental Tourist] (2006-2016) to which the aforementioned video Método básico de assovio gomero-tupi [Basic Method for gomero-tupi Whistle] (2014-2016) [pp. 106-07] belongs to.The piece was inspired by an episode of the life of the Spaniard priest-saint José de Anchieta, who traveled to Brazil with a Portuguese Jesuit mission. The priest is widely known for writing Arte da Gramática da Língua mais falada na costa do Brasil [Grammar Art of the Most Spoken Language of The Coast of Brazil] (1595), the first recorded Tupi language grammar produced in the West. Father Anchieta, who was born in the Canary Islands, dutifully taught the Catholic religion to the Tupi community through poetry due to his refusal to impose more invasive nor violent lessons of the Western monotheistic religion to the natives. 

    Rennó’s unassuming meditation of the Brazilian colonial memory takes us back to Sigmund Freud’s ruminations on the wunderblock (the mystic writing pad), which the Viennese thinker described as: “(...) a slab of dark brown resin or wax with a paper edging; over the slab is laid a thin transparent sheet, the top end which is firmly secured to the slab while its bottom end rests upon it without being fixed to it.” (4) The wunderblock is a twentieth-century children’s toy with the function of an aide-mémoire device, which according to the Freud “is the return to the ancient method of writing upon tablets of clay or wax: a pointed stylus scratches the surface, the depressions upon which constitute the writing.” (5) If the wunderblock aimed to establish a neurotic play of writing and erasing, Freud also pointed out that its wax slab kept tracks of the hidden memory of the erased writings, just as it occurs in the impressions of our mental apparatus and its unfathomable tissue (the unconsciousness). In Rennó’s straightforward Método básico de assovio gomero-tupi, the screen is positioned vertically, pushing the analogy with the wunderblock even closer than expected. The sand and the ocean embody topical metaphors of the colonial journey from Europe to South America, which a traumatic memory is restaged by the artist through the myth of the priest who stubbornly wrote 5,000 verses on the sand due to the lack of ink and paper: “He was seen on the beach writing and rewriting”, remarked Rennó on her synopsis of the piece (6).

    HISTORIES OF PHOTOGRAPHY 

    Deep down, what is history, actually? Malraux: We all felt that the gamble belonged to a deeper field than the political one. Braudel: Let the people of those who deny their misery be measured. The number of hearts that want to be themselves and, despite everything, live their lives. As if we were masters of our own life. As if it were at our disposal. And this goddamn quote from Cioran: Our knowledge does not except us from redemption. Sooner or later, we pay dearly for any daring thoughts or indiscretion of the spirit. And the young Péguy: Oh, the history! The unquestionable fidelity to things that are long ago disappeared. What always happens, my friend? 

    It gets dark. The vacations are over. I take one day long to produce an one-second story; one year long to produce an one-minute story; a life to produce an one-hour story; and an eternity to produce an one-day story. You can produced any story, except for the one somebody has already did. 

    Jean-Luc Godard (7) 

    Renno’s work, in its temporal hiatuses, is grounded on and framed by the history of photography. The artist developed her poetics by the 1980s, when such a narrative started to become formulated in the plural; so, to speak, as the histories of photography. Paradoxically, the medium only earned its own right to belong to museum collections when photographic images began to be interpreted, appropriated, reconfigured and questioned by artists from the Global South to the overriding North towards the end of the twentieth century. More importantly, seen as too contingent, photography unfolded both the dysfunctionality and ideological discontents summarized by modern art presenting a historiographic counter model equipped for undertaking a decentered agency, being “too constrained by the world that was photographed, too dependent upon the discursive structures which it was embedded” to become autonomous in modernist terms (8). It was through photography that the ethnographic gaze was produced and widely spread from the end of the 19th century. 

    A century later, it was dismantled, or at least deconstructed by ethnographers, anthropologists, and artists who showed the cracks of the Western canon in its attempt to create a joint enterprise between the screen of perception and reality. 

    Unlike many photographers in Latin America who by the end of the Cold War were still concerned with providing a life extension to the already waning documentary practices, Rennó’s critical investment in contesting the principles of the photographic image led her to explore new hermeneutical possibilities for the medium (9). From the documentary evidence to the archival record, Rennó’s multidimensional and free approach to photography distills, to a greater extent, the fundamental debates that shaped a field in which important voices such as that of Martha Rosler (1943), and even earlier those of the Colombian filmmakers Luis Ospina (1949-2019) and Carlos Mayolo (1945-2007), questioned the myth of journalistic objectivity in direct photography and documentary filmmaking (10). Rennó’s appropriative path to direct photography, her tactical sense of the archive as a precious source to relocate the unsung heroes of the optical unconsciousness, avoided the moral rhetoric of the documentary genre to favor a quest for formal and conceptual permutations connected to reality. Her decisive moment aims to reveal the traps of the dysfunctional social discourse of a medium created based on the modernism logic. From the life-size portraits of workers who built Brasilia in her monumental installation Imemorial [Immemorial] (1994) to the more recent Operação Aranhas/Arapongas/Arapucas [Operation Spiders/Bellbirds/Traps] (2014-2018) [pp. 84-85], Renno’s photographic rearrangements address the transition from the Benjaminian mechanical reproduction to the liquidity of the digital era (11). 

    The deconstructive line of thinking behind Operação Aranhas/Arapongas/ Arapucas—, which comprises 13 triptychs, each arranged from photographs made by three Brazilian photographers (including Rennó) at specific times and events—is the temporality of images. Thirteen photographs were taken by José Inácio Parente (1942) during the Passeata dos Cem mil [March of Hundred Thousand] in Rio de Janeiro, on June 26, 1968. Thirteen other photos were taken by Rennó during the Comício das Diretas Já [Direct Elections Now Rally] in Belo Horizonte on February 24, 1984. The last thirteen images by Cia de Foto were shot during the Movimento Passe Livre [Free Pass Movement] in São Paulo on June 17 and 20, 2013. All the photos documented major political demonstrations in Brazil, since the military dictatorship, which, according to the artist, “look similar.” Rennó explained her strategy: “To each event, I chose one specific pattern of embossed silk paper—the traditional type of interleaving of pages of old photo albums. The recognition of the three different events was possible due to the difference between the patterns of silk paper. Camera lenses and filters allow us to glimpse the faces in the crowd, a reference to the way the informants (the so-called ‘arapongas’) of the military police used to highlight the individuals considered subversive to the Brazilian dictatorship, in the photographs of rallies or groups of protesters.” (12) If we go back to the Cicatriz [Scar] series (1996) [pp. 96-97]—an emblematic installation composed of 18 archival black and white photographs of tattooed prisoners displayed with journalistic texts from different sources—we will find an alternative historiographic account written from the side tracks of the so-called human sciences and humanities disciplines. 

    Rennó’s work deploys the ethical complexities, challenges, and opacities of the molecular economy of the distribution of goods and services, a disjunctive order brought up by the deterritorialized model of late capitalism. Such a model exposed the tip of a political melting iceberg, more visibly present after the turmoil triggered by the Odebrecht case of corruption networks, which also created a chain of political unrest in the Southern region, where authoritarian forces of different signs were unleashed. In Peru, for instance, four former presidents were involved in the corporation’s system web of briberies and one of them committed suicide. The frame provided by the histories of photography encompasses a Janus-face construction of broader political-poetical narratives, both as myths and fictions, and objective facts, half-made, because it is in the perpetual process of being made. 

    Rennó uses archival images of three historical markers of the civil rights movement in Brazil, from the “anos de chumbo” [“Years of Lead”] to the present, to undo documentary photography’s logic of immunization. Her conceptual engagement with the photography histories summarizes an array of installations, artist’s books, films, photo prints, and gravures. More importantly, this monumental body of works also underpins the modes in which processed images reflect the transition from the ethos of the Brazilian avant-garde to the (post) dictatorial era. Renno’s exploration of different modes of presentation tackles the parasitical function of images within the ideological circuits of appropriation, which operate in tandem with innovative methods of artistic production that resulted from definitions of local art histories, painting, and experimental film practices. Thus, the photography histories, in plural, can eventually reverse the Freudian death drive (13). 

    LIFE AFTER IMAGES 

    There is no archive without a place of consignment, without a technique of repetition, and without a certain exteriority. No archive without outside. 

    Jacques Derrida (14) 

    Is there any life after images? Are images resilient to destruction? These bold questions seem tempered after a year of digital confinement, when screens dominated and still dominate our everyday lives threatened by the pandemic fever. Since the emergence of the internet, images have become exponentially ubiquitous and travel at the speed of light. Images are the very prophesy of futurism realized. 

    Before the COVID-19 lockdown, Rosângela Rennó was invited to participate in “Artist meets Archive,” an art residency program located in Cologne, Germany, as part of the Internationale Photoszene Köln. It was scheduled to take place in 2020, when she would research in the Stiftung Rheinisch-Westfälisches Wirtschaftsarchiv zu Köln, the Rhenish- Westphalian Economic Archive Foundation in Cologne (RWWA). Although her original plans changed radically due to the pandemic, she exposed a project partially based on the RWWA files at the MAKK, the Museum for Applied Arts, between May 21 and July 5, 2021. Confined in Brazil, Rennó dug remotely to trace the origins and histories of the Eau de Cologne, which was “invented” in the city of Cologne. The artist assembled Eaux des colonies [Waters from Colonies] (2020-2021) [pp. 112-15], an extensive open-ended timeline, which has been displayed on a long wall at a gallery space, exposing how the invention of the perfume was disputed, appropriated, and became a token for both commercial wars and nationalist or regional antagonisms. The timeline was accompanied by an installation of glass jars and bottles partially full of alcohol, representing all the countries that were colonized at some point in their respective histories. Rennó stated: 

    When documents become images and are accessible through the Internet, we experience a kind
    of equalization effect of the information. For better or for worse. Historical archives, history blogs, perfume history within sales sites, all together... it all seems like an updating of the concept of the “imaginary museum,” created by André Malraux. This effect is perverse and seems to have been consolidated forever (15). 

    What the artist identified as “the equalization effect of information” is, in fact, a defining paradox that is generally applied to photography. In this sense, Thierry de Duve’s observation about the always arbitrary context of an image may be useful to prove that the archival topos is dislocated from the web (although operates within its confines): 

    Photography is generally taken in either of two ways: as an event, but then as an odd looking one, a frozen gestalt that conveys very little, if anything at all, of the fluency of things happening in real life; or it is taken as a picture, as an autonomous representation that can indeed be framed and hung, but which then curiously ceases to refer to the particular event from which it was drawn (16).

    In addition to the decontextualization of images from the event that they refer to, an image of a particular document released and circulated on the web ceases to dwell in or belong to any place. Its content is also separated from its meaning. 

    As Rennó aptly pointed out, lacking a guarded space condemns the document to a virtual disintegration and oblivion. Jacques Derrida, who wrote about the topic upon the arrival of the internet, asserted that archives only take place in their domiciliation, as that marks the transition from private to public. A body of knowledge fragmented in images and discourses requires the hermeneutic stability of a place to be sheltered and concealed under an authority who would provide an identity, a unity, and, ultimately, a classification to the documents to transform them eventually into an archive (17). 

    Despite the difficulties due to the pandemic’s travel and research restrictions, the Eaux des colonies project’s self-referentiality, as well as its over-extended boundaries beyond a genealogy, pledges to bring some grounding to the question of the archive in times of the plague, when the body and its senses are attacked by the COVID-19. 
    1. The author wants to thank Ana Maria Maia and Rosângela Rennó for all their generous help as well as Diana Flatto and Angelina Jaffe. Luiz Viera deserves an acknowledgement for his editorial recommendations. 
    2. Elizabeth Bishop, “Brazil, ‘January 1, 1502’,” in Poemas Escolhidos de Elizabeth Bishop (São Paulo: Companhia das Letras, 2012), 222, 224. 
    3. Victor Segalen, Ensayo Sobre el Exotismo: Una Estética de lo Diverso, trans. Jorge Ferreiro (Mexico City: Fondo de Cultura Económica, 1989). 
    4. Sigmund Freud, “A Note upon the “Mystic Writing Pad,” in General Psychological Theory (1925), 210, http://cscs.res.in/courses_folder/dataarchive/ textfiles/textfile.2011-12-30.8604273949/file. 
    5. As Freud pointed out, in the case of the Mystic Pad “the scratching is not effected directly but through the medium of the covering-sheet (...).” Ibid., 209. 
    6. Rosângela Rennó, “Transcendental Tourist,” in Espírito de Tudo: Rosângela Rennó, ed. Evangelina Seller (Rio de Janeiro: Cobogó, 2017), p. 96. 
    7. Transcribed from the video Histoire(s) du cinéma [Histories of Cinema] (1980-1998), our translation. 
    8. Douglas Crimp, “The Museum’s Old/The Library’s New Subject,” in The Contest of Meaning, ed. Richard Bolton (Cambridge, MA: MIT Press, 1992), 8. 
    9. See: Wendy Watriss and Lois Parkinson Zamora, Image and Memory: Photography from Latin America, 1866-1994 (Austin: University of Texas Press, 994). The exceptions make also the rule as we can find critical voices in the works of Milagros de la Torre, Leandro Katz, Alexander Apóstol, and Victoria Cabezas. 
    10. Martha Rosler, “Around and Afterthoughts (on documentary photography),” in The Contest of Meaning, ed. Richard Bolton (Cambridge, MA: MIT Press, 1992), 303. Rosler formulated an elaborated neo-Marxist critique to the exploitative tenets of what she defined as the liberal goal of the documentary photography and photo-journalism. By contrast, filmmakers Luis Ospina and Carlos Mayolo coined the term “porn misery” in a statement in which they reclaimed the right to self-reflect their context in terms of examining its different temporalities rather than showing the cliches of poverty and depravation used as mise- en-images to sell the misery of the Third World. Working from Cali, Colombia Ospina and Mayolo made an important contribution to the post- colonial film theory. See: Michèlle Faguet, “What is Poverty Porn?,” in SITAC VIII: Blind Spots, ed. Gabriela Rangel (Mexico City: Patronato de Arte Contemporáneo, 2011), 150-159. 
    11. See Walter Benjamin, “The Work of Art in the Age of its Technological Reproducibility: Second Version,” The Work of Art in the Age of its Technological Reproducibility, and Other Writings on Media, eds. Michael W. Jennings, Brigid Doherty, and Thomas Y. Levin (Cambridge, MA: Harvard University Press, 2008), 19-55.
    12. Correspondence with the artist, July 2021.
    13. See Sigmund Freud, Civilization and Its Discontents (New York: W. W. Norton & Company, 2010).
    14. Jacques Derrida and Eric Prenowitz, “Archive Fever: A Freudian Impression,” Diacritics 25, no. 2 (1995): 9-63, https://doi.org/10.2307/465144.
    15. Rennó could not conduct a thorough field research due to pandemic travel restrictions. The quote was sent by the artist.
    16. Thierry de Duve, “Time Exposure and Snapshot: The Photograph as Paradox”, October 5 (1978): 113-125. 17 Jacques Derrida and Eric Prenowitz. “Archive Fever: A Freudian Impression,” Diacritics 25, no. 2 (1995): 9-63,
    17. https://doi.org/10.2307/465144. 




    RANGEL. Gabriela. Three Side Steps to Rosângela Rennó’s Archive. In Rosângela Rennó: little ecology of the image. São Paulo: Pinacoteca de São Paulo, 2021, pp. 117-127.