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Evidências ocultas*


Hidden Evidence*




    Por qué nos inquieta que el mapa esté incluido en el mapa, y las mil y una noches el en libro de Las mil y una noches? Por qué nos inquieta que Don Quijote sea lector del Quijote y Hamlet espectador de Hamlet? Creo haber dado con la causa: tales inversiones sugieren que si los caracteres de una ficción pueden ser lectores o espectadores, nosotros, sus lectores o espectadores, podemos ser ficticios.


    J. L. BORGES


    A técnica da mise en abîme deriva da tradição heráldica de se inserir, no interior da cena que adorna um escudo, um outro escudo de dimensões menores, sobre o qual, por sua vez, representa-se uma cena, geralmente diferente da principal. No âmbito literário, a expressão descreve um simples e difuso estratagema retórico, no qual uma história secundária e circunscrita é inserida em uma história principal, completando-a. Em alguns casos, como aquele célebre de Hamlet, que assiste á encenação do homicídio do pai, é um fragmento ou um resumo a ser cravado no interior da história principal. O mesmo procedimento pode ser utilizado no âmbito das artes visuais, substituindo a narração literária pela iconografia: os desenhos “impossíveis” de Escher são ótimos exemplos dessa tradição.

    As obras de Rosângela Rennó, nas quais a artista refotografa velhas fotos e velhos negativos (1), podem ser consideradas ótimos exemplos de mise en abîme, tanto do ponto de vista mecânico quanto conceitual. Nascem da repetição mecânica de um gesto (o de tirar fotos) já executado (2): ao mesmo tempo, a imagem final remete conceitualmente ao original do qual ela foi tirada, sobrepõe-se a esta e a completa, tornando-a finalmente compreensível em todas as nuances. Como um conto fantástico de Borges, o espectador é colocado diante de duas imagens, mas vê somente uma. De fato, nesta extraordinária mise en abîme, a segunda imagem não é inferior a primeira nem em dimensões nem em importância: ao contrário, é uma reprodução tão fiel, que se sobrepõe perfeitamente ao original, eclipsando-o…

    Esse procedimento, além disso, permite outras reflexões. Se sempre se atribuiu a produção fotográfica um caráter eminentemente tautológico, o simples ato de refotografar uma foto cria um curto-circuito. O que vemos não é o que vemos ou, parafraseando Barthes, o cachimbo não é um cachimbo: é a foto de um cachimbo (3). Estamos diante, portanto, de uma tautologia não do real, mas, ao contrário, do imaginário: mais do que simplesmente reproduzir a realidade, de fato, a nova fotografia registra a diferença, invisível, entre a imagem de partida e sua segunda versão. Em outras palavras, registra, com um procedimento puramente mecânico, uma ideia. Caso se queira compreender seu verdadeiro significado, a simples observação da foto não pode ser suficiente; será necessário conhecer a história de sua dupla gênese.

    Ao se definir Rennó como fotógrafa que não fotografa (4), portanto, corre-se o risco de se omitir um aspecto conceitualmente importante de sua obra, na qual naturalmente falta a preocupação com a escolha de campo, geralmente associada com a praxe fotográfica; mas isso só ocorre porque o problema é superado por uma abordagem intelectual, isenta de considerações de tipo formal. Certamente, o ato de fotografar é fundamental: ratifica uma decisão refletida e não uma intuição ou uma coincidência momentânea de fatores externos.

    Imemorial (1994) pode ser considerada a primeira obra importante, na qual a artista trabalha a partir de fotografias preexistentes. Fruto de uma longa pesquisa nos arquivos de Brasília, constitui-se de uma série de ampliações obtidas a partir das pequenas fotos (3x4 cm) das carteiras de identidade de operários mortos na construção da cidade. Desse modo, a artista traz a luz um passado metodicamente apagado pela história oficial (5), cujas pegadas seria inútil procurar nas linhas sinuosas da urbe inventada do nada por Lúcio Costa e Oscar Niemeyer. Formada em arquitetura, Rennó é perfeitamente consciente de quanto aquelas formas arrojadas traíram, em seu estilo vagamente “aerodinâmico”, a vontade de nação de se projetar, num impulso, rumo ao futuro. Observando-os hoje, porém, a luz da história dramática do país nos últimos cinquenta anos, esses edifícios parecem ter continuado vítimas de um feitiço: o futuro que ambicionavam nunca chegou e, de monumentos do porvir, transformaram em reminiscências, sem nunca coincidirem com o presente. Essa incongruência lhes confere, em lugar da ambição futurista, um fascínio melancólico.

    As fotos de Rennó sobrepõem a esta constatação formal uma denúncia de cunho social difícil de se ignorar, lançando uma nova luz no sonho de modernidade do Brasil. Sustentadas por uma tensão real, vibrante, parecem, nesse sentido, pertencer, também pelo trabalho de pesquisa do qual nasceram, mais ao universo de investigações jornalísticas do que ao da arte; apesar de algumas afinidades formais, é exatamente o rigor ético que torna inconfundíveis as fotos de Imemorial. Com relação as obras publicadas por Christian Boltanski aos “Suiços mortos”, por exemplo, não há aqui nenhum traço de ironia (6), somente dramáticas, “fragmentárias interrupções de amnésia” (7).

    A mesma tensão e a atmosfera de denúncia permeiam também as obras baseadas na recuperação de velhos negativos. Cicatriz (1996), resultado de uma pesquisa da qual nasceram, depois, outras obras, como Museu Penitenciário (1997-99) e Vulgo (1998-99), é uma seleção de fotos de detentos, retirados do extinto arquivo fotográfico criado na Penitenciária do Estado, situada no antigo complexo do Carandiru, em São Paulo, nos primeiros anos do século XX (8). Realizadas provavelmente com o fim de criar um fichário completo dos detentos, as fotos registram escrupulosamente seus “sinais particulares”, principalmente as tatuagens. Incisões feitas grosseiramente na pele, reduzem-se a poucos motivos rudimentares: concebidas para distinguir, as tatuagens acabam por homologar os prisioneiros, tornam-se os sintomas silenciosos de uma doença difusa, de uma dor inconfessável.

    Mesmo neste caso, a técnica utilizada é um fator fundamental para a compreensão da obra. Os retratos originais são mecânicos, frios, anônimos: atentado a individualidade de cada um dos sujeitos, justificam sua culpabilização coletiva. Para não ser cúmplice desse atentado, Rennó recoloca-o em cena, revirando a situação técnica e “poeticamente”. Refotografando os negativos, a artista percorre um caminho oposto ao da instituição que encomendou as fotos: se, então, o estado de prisão dos detentos era elevado ao quadrado pelas fotos de identificação, fotografando as fotos Rennó as coloca no lugar dos presos e, por extensão, coloca o cárcere no lugar dos encarcerados. O seu é um gesto social: a tentativa (poética e conscientemente fadada ao insucesso) de recompor a identidade dos sujeitos através de mise en abîme do seu aniquilamento.

    Com Série Vermelha (Militares) Rennó dá um último passo para frente. Muito além das transformações formais, realmente evidentes tanto na escolha dos sujeitos como no insólito recurso cromatismo9, o que toca nessas fotos é sua profunda coerência com as obras anteriores. O que os protagonistas desses grandes retratos (10) têm em comum é o mero detalhe das divisas que usam. É evidente a reviravolta com relação ao universo precário dos operários e dos detentos: os sujeitos pertencem todos a classe dominante, e os uniformes são o certificado de que fazem parte, mais do que a um exército fantasmagórico e distante, dessa elite.

    Quase que ressaltando sua condição privilegiada, o domínio que sentem em atuar no mundo em que vivem, os protagonistas destas fotos são mortalizados ao ar livre, em lugares de veraneio e entretenimento, de prazer (lugares totalmente proibidos tanto aos operários quanto, naturalmente, aos detentos). Quando o pano de fundo não é um panorama “de cartão postal”, como a baia do Rio de Janeiro (Mad Boy), é pelo menos uma praia ensolarada (Castle King), o jardim de família, onde são fotografados primeiramente o avô, e depois, o neto (Old Prussian, Young Prussian) ou ainda – e é talvez o caso mais sugestivo – um muro sobre o qual se possa projetar, bem nítida, a sombra do militar (Shadow). Neste detalhe extremamente humano concentra-se a distância abissal que separa os militares dos operários e dos detentos, fotografados sempre diante do canônico fundo neutro, preto ou branco e rigorosamente plano, sem mais direito a luz do sol e, consequentemente, a uma sombra que sancione esta sua característica de pertencer a sociedade dos homens. A escolha de ressaltar, através do título (11), um detalhe aparentemente insignificante, confirma, afinal, sua importância para a compreensão do significado abrangente da obra.

    Se, nas obras dos anos 90, a diferença entre o espectador e o sujeito da fotografia era evidente, e a reflexão sobre a técnica empregada e sobre o significado da obra podia ser isolada e objetiva, neste caso, o procedimento é mais complexo. Além disso, o confronto com as obras anteriores é fundamental para a compreensão da originalidade da Série Vermelha (Militares). Em vez das rígidas fotos de identificação, Rennó serve-se, na produção desta série, de simples fotos de recordação, não diferentes daquelas que todos temos em alguma gaveta: documentos sem pretensão e um pouco desbotados de dias passados. A falta de uma injustiça social desorienta o observador: queira ou não, é sorvido para dentro da imagem pela sua “fisionomia social”, idêntica aquela dos sujeitos representados. Principalmente em um país como o Brasil, realmente marcado por enormes contrastes sociais, o espectador de uma exposição de arte contemporânea pertence quase invariavelmente a uma classe social de certa forma privilegiada (12). Reconhecendo-se naquele quer vê, é obrigado a se definir como cúmplice do processo que levou a situação desmascarada pela artista.

    Trazidas à luz, as evidências ocultas de que se nutre o trabalho fotográfico de Rosângela Rennó mostram os estigmas da passagem pelas trevas da ocultação ou do esquecimento. Sintomas inconfundíveis da patológica ânsia de esquecer de um país jovem e sempre projetado para o futuro, constituem, diante da desordenada aspiração ao bem-estar e a riqueza do primeiro mundo, um salutar momento mori.

    *O título remete a uma frase de Rosângela Rennó, contida na entrevista concebida a Hans-Michael Herzog para o catálago da exposição La Mirada – Looking at photography in Latin America today, Edition Oerhli, Zurique, 2002, pág. 151: “Evidências são sempre evidências, mesmo quando elas estão ocultas”. O presente texto retoma algumas considerações contidas em meu ensaio La vita degli altri [A vida dos outros], publicado na revista italiana ArteIn, número de fevereiro-março de 2003.


    1. Em razão do espaço, só será possível analisar aqui algumas obras. Além da grande importância dessas obras no contexto da carreira de Rennó, a escolha foi guiada pelo desejo de fazer reflexões gerais sobre o trabalho eminentemente fotográfico da artista, cujo ápice, até o momento está representado pela Série Vermelha (Militares), apresentada na 50a Bienal de Veneza e reproduzida integralmente neste catálogo.
    2. Não entro aqui no detalhe das várias técnicas utilizadas. Pouco importa, de fato, se a nova imagem é obtida com meios fotográficos tradicionais ou com tecnologias digitais: os dois procedimentos dão lugar a uma mise en abîme.
    3. Em seu La Chambre Claire. Note sur la photographique (Gallimard, Paris, 1980), Roland Barthes escreve: “Por natureza, a fotografia tem algo de tautológico: um cachimbo é sempre um cachimbo”. Sobre a natureza da imagem fotográfica, vide também A. Bazin, Ontologie de l’image photographique, in Qu’est-ce que le cinema?, Paris, 1958.
    4. Cfr. Tadeu Chiarelli, in Tridimensionalidade na Arte Brasileira do século XX, São Paulo, Itaú Cultural, 1997, pág.176, mas é uma definição utilizada, depois, também por outros críticos.
    5. Durante as pesquisas feitas nos arquivos da cidade, Rennó encontrou, além das fotos que constituem a obra, também provas de um verdadeiro massacre de trabalhadores “rebeldes”, até hoje cuidadosamente escondido pelo governo. 
    6. Em várias ocasiões, Boltanski declarou sarcasticamente ter escolhido os “Suiços” como protagonistas desta série porque aparentemente “não tem razão nenhuma para morrer”.
    7. Paulo Herkenhoff, Espessura da Luz, A fotografia brasileira contemporânea, São Paulo, Câmara do Livro, 1993, p.36.
    8. Para uma descrição mais detalhada do processo que levou a produção destas obras, vide La Mirada, op. Cit., p.152.
    9. A cor já tinha sido utilizada antes, nas fotos da série Vulgo e em outras “menores”, mas extremamente reveladoras, como Paz Armada (1990-92), mas nunca com uma força comparável aquela presente na Série Vermelha (Militares). É importante observar, além disso, que a cor utilizada é sempre o vermelho, diretamente associado, pela artista, tendo-o admitido explicitamente, ao sangue.
    10. Mais uma vez, trata-se de velhas imagens provenientes de álbuns domésticos, refotografadas e, portanto, passadas para o vermelho por um processo digital, a ponto de ficarem quase indistinguíveis.
    11. A importância dos títulos e, em geral, das palavras na obra de Rennó poderia ser objeto de um ensaio por si só. Penso nos textos extraídos de jornais e revistas, que confluem no grande Arquivo Universal, reservatório que usa para suas criações; mas penso também nos neologismos e nos calembour, que frequentemente constituem os títulos de suas obras. Trabalhos recentes como Espelho Diário (2001) e a grande instalação Bibliotheca (2002), dão continuidade, nesse sentido, a um discurso iniciado em obras anteriores, aprofundando realmente a dimensão literária (oral, no caso do vídeo, escrita, no caso das fichas de arquivo da instalação), sugerida pelos títulos das fotos da Série Vermelha (Militares) ou, antes ainda, por obras como In Oblivionem (1994), Hipocampo (1995) ou Cicatriz.

    Sobre o papel das palavras na obra de Rennó, vide também Paulo Sergio Duarte, Para reler o vermelho e o negro, no folder publicado pela Laura Marsiaj Arte Contemporânea, por ocasião da exposição de Rosângela Rennó em novembro de 2001.
    1. De modo geral, o mesmo discurso vale também para os artistas: é significativo que para a 50• Bienal de Veneza, a própria Rennó tenha produzido uma obra a partir de uma velha foto de família, na qual seu irmão é retratado em uniforme militar.


    VISCONTI, Jacopo Crivelli. Evidências ocultas. In Sonhos despedaçados / Beatriz Milhazes Rosângela Rennó. São Paulo: Fundação Bienal de São Paulo, 2003, p.42-54.
    Why does it make us uneasy to know that the map is within the map and the thousand and one nights are within The 1001 nights? Why does it disquiet us to know that Dom Quixote is the reader of the Quixote, and Hamlet is a spectator in Hamlet? I believe I have found the answer: those inversions suggest that if the characters in a story can be readers or spectators, then we, their readers or spectators, can be fictitious.

    _J. L. Borges


    The technique of mise en abîme stems from the heraldic tradition of inserting a second smaller shield representing a particular scene, generally different from the main setting, within a scene adorning a shield. In terms of literature, the expression describes a simple diffused rhetoric stratagem whereby a secondary circumscribed story is inserted into the main plot to complete it. In some cases, such as the famous scene where Hamlet witnesses the staging of the homicide of his father, it is a fragment or a summary of the main story that is inserted therein. The same procedure can also be used in the visual arts, replacing the literary narrative by iconographic narrative: the “impossible” drawings by Escher, for instance, are good examples of this tradition.

    Rosângela Rennó’s works of art where the artist re-photographs old pictures and old negatives (1) can be considered good examples of mise en abîme, both from the mechanical and conceptual standpoints. They derive from the mechanical repetition of a gesture (the click of a camera) already performed; (2) at the same time, the final image refers conceptually to the original from which it is taken, superposes and completes it, eventually making it intelligible in all its nuances. In the same way as in a fantastic story by Borges, the spectators are set before two images, but are only able to see one. Indeed, in this extraordinary mise en abîme, the second image is not inferior to the first neither in terms of size nor of importance – quite to the contrary, the reproduction is so true that it can be perfectly superposed on the original to eclipse it entirely…

    Moreover, this procedure allows for furthers thought. If an eminently tautological feature has always been ascribed to photographic production, the simple act of re-photographing a photo generates a short circuit. What we see is not what we see, or paraphrasing Barthes, a pipe is not a pipe: it is the picture of a pipe (3).  Therefore, we are before a tautology, not of the real but, on the contrary, of the realm of fantasy: by more than simply reproducing reality, the new photograph records the invisible difference between the original image and the second version. In other words, is records an idea through a purely mechanical procedure. If we want to understand its real meaning, merely viewing the picture will not be sufficient: it will be necessary to know the story of its double genesis.

    In defining Rennó as a photographer who does not photograph, (4) there is a risk of leaving out a conceptually important aspect of the work, where there is naturally a lack of concern in respect of the choice of field with which photographic praxis is generally associated, but this is so only because the problem is solved through an intellectual approach, free from considerations of a formal nature. The act of taking the photograph is therefore essential: it confirms a deliberate decision, and not an intuition or a short-lived coincidence of external factors.

    Imemorial (1994) can be considered the first important work where Rennó performs on the basis of pre-existing photographs. Based on extensive research in the archives of Brasília, the work is made up of a series of enlargements of small pictures (3x4cm) from the identity cards of workers who died in the construction of the city. Thus, the artist sheds light on a past systematically canceled out of official history (5) where would be senseless to search for any trace in the sinuous lines of the city conceived from scratch by Lúcio Costa and Oscar Niemeyer. With a degree in architecture, Rennó is perfectly aware to what extent these daring shapes, in their vaguely “streamlined” style, betrayed the desire of a nation to throw itself, at one thrust, into the future. Viewing them today, in the light of the dramatic history of the country over the last fifty years, it would see that these buildings have suffered under a spell: the future they craved for has never come into being, and from monuments of the future they have become remnants of the past, never coinciding with the present. By this incongruity their once futuristic ambition has become instead a melancholic fascination.

    To this formal conclusion Rennó’s pictures add an indictment of a social nature that is difficult to disregard, shedding new light on the dream of modernity for Brazil. Supported by real vibrant tension, in this sense, and also due to the work of research they result from, they seen to belong to the universe of journalistic investigations rather than that of art; despite some formal affinity, it is precisely the ethical strictness that makes the picture of Imemorial unmistakable. In comparison to the works dedicated by Christian Boltanski to the “dead Swiss”, for example, there is no touch of irony (6) here, but only dramatic, “fragmentary interruptions of amnesia”. (7)

    The same tension and the atmosphere of indictment also pervade her work based on the restoration of old negatives. Cicatriz (1996), the outcome of research from which other artworks subsequently resulted, such as Museu Penitenciário (1997-99) and Vulgo (1998), is a selection of photographs of inmates, from the extinct archives of photographs created in the State penitentiary located at the Carandiru prison complex in São Paulo, in the first year of the twentieth century (8). Taken probably for the purpose of producing a complete listing of inmates, the pictures record “particulars signs”, mostly tattoos, with great accuracy. Unrefined incisions on the skin, they sum up to a few rudimentary patterns: conceived as a form of identification, tattoos eventually characterized the prisoners as the silent symptoms of a diffuse illness, of an unconfessable pain.

    In this case as well, the technique used is a crucial factor to understand the work. The original portraits are mechanical, cold, anonymous: an attempt on the individuality of the single subjects, they justify collective guilt. In order not to be an accomplice, Rennó stages this assault once more, reverting the situation both technically and “poetically”. By rephotographing the negatives, the artist follows a path that is opposed to that of the institution that ordered the pictures, yet by photographing the pictures Rennó sets them in place of the prisoners, and by extension sets the prison in the place of the captives.

    The nature of her gesture is social: the attempt (poetically and consciously doomed to fail) to reconstruct the identity of the subjects through the mise en abîme of their annihilation.

    With Série Vermelha (Militares) Rennó moves a step forward. Beyond the major formal transformation, evident in both the choice of the subjects as well as uncommon use of chromatism (9), what is most striking in the picture is their deep coherence with previous works. The protagonist of these great portraits (10) finds a common denominator in the uniforms they wear. The reversal of the precarious universe of workers and inmates is obvious; all the subjects belong to the dominant class, and their uniforms, rather than attesting to their membership in a phantomlike distant army, certify their belonging to this élite.

    Almost underscoring their privileged condition, their feeling that they are masters of the world in which they live, the protagonists of these pictures are immortalized in the open air, in vacation resorts and therefore places of leisure, of pleasure (universes that are completely forbidden both the working class and, obviously, to inmates). When the background is not a “postcard” view with the bay of Rio de Janeiro (Mad Boy), at least there is a sunny beach (Castle King), a family garden where the grandfather is portrayed first and then his grandson (Old Prussian, Young Prussian), or even – the most suggestive case – a wall upon which one can clearly see the shadow of the soldier (Shadow). This very human detail concentrates the abyssal distance that separates soldiers from workers and inmates, always photographed in the foreground with a solemn neutral background, black or with and strictly flat, not entitled to the sun light any more, nor consequently to a shadow that ratifies their belonging to humankind. Besides, the choice to highlight an apparently insignificant detail through the title (11) confirms its importance to an understanding of the overall meaning of the work.

    Although in the ‘90s the difference between the spectator and the subject of the photograph was evident, and the thought about the technique used and the meaning of the artwork could be separated and objective, in this case the procedure is more complex. In addition, the comparison with the previous artwork is essential for understanding the originality of Série Vermelha (Militares). Instead of the strict identity photographs, in this series Rennó uses simple commemorative ones, which are no different from those we all have in any drawer: unpretentious and somewhat faded documents from the old days. The lack of an easily identified and disapproved social injustice disconcerts observers: like it or not, they are swallowed within the image by their “social face”, identical to that of the subjects portrayed. Especially in a country like Brazil, marked by enormous social contrasts, the spectator of an exhibition of contemporary art almost invariably belong to a social class that is in a certain way privileged (12). By recognizing themselves in what they see, they are forced to define themselves as accomplices of the process that led to the situation unmasked by the artist.

    Brought to light, the hidden evidence from which the photographic work of Rosângela Rennó takes its essence shows the marks of the passage through the darkness of concealment or oblivion. The unmistakable symptoms of pathological wish for forgetting felt by a young country always projected into the future constitute, in light of the disordered longing for well-being and wealth displayed by the first world, a healthy memento mori.

    *The title refers to a statement by Rosângela Rennó in the interview to Hans-Michael Herzog for the catalogue of the exhibition La Mirada – Looking at photography in Latin America today, edition Oerhli, Zurich, 2002, page 87: “Evidence is always evidence, even when it is hidden.” The present text takes up some considerations contained in my essay La vita degli altri, published in the February – March 2003 issue the Italian magazine ArteIn.

    1. For reason of space, it will be possible to analyze only some works here. In addition to the great importance of these works in the context of Rennó’s career, the selection was oriented by the wish to develop a general reflection on the eminently photographic work of the artist, whose acme up to now is represented by Série Vermelha (Militares), presented at tha 50th Venice Biennale and entirely reproduced in this catalogue.
    2. Here I do not detail specific aspects of the various techniques used. Actually, it does not matter if the new image is obtained through traditional photographic means or by using digital technology: both procedures give rise to a mise an abîme.
    3. In his la Chambre Claire. Note sur la Photographie (Gallimard, Paris, 1980), Roland Barthes writes: “By nature photography has something tautological: a pipe is always a pipe.” On the nature of the photographic image see also A. Bazin, ‘Ontologie de L’image photographique”, in Qn’est-ce que le cinema?, Paris, 1958.
    4. Cf. Tadeu Chiarelli, in Tridimensionalidade na Arte Brasileira do século XX, Itaú Cultural, São Paulo, 1997, page176, however this definition is subsequently used by other critics as well.
    5. During her research in the archives of the city, in addition to the pictures that make up her artwork, Rennó found the evidence of a real slaughter of “rebel” workers, until today carefully concealed by the government.
    6. On several occasions, Boltanski declared in a sarcastic way that he chose “the Swiss” as protagonist of this series because apparently “they have no reason at all to die.” 
    7. Paulo Herkenhoff, Espessura da luz, a fotografia brasileira contemporânea, Câmara do Livro, São Paulo, 1993, page 36.
    8. For a more detailed description of the process that led to the production of these artworks, see La Mirada, op cit., page 88.
    9. Color was previously used in the photographs of the series Vulgo and in “mirror” though extremely revealing artworks, such as Paz Armada (1990-92), but never with a strength comparable to that of Série Vermelha (Militares). However, it is important to observe that red is always the color used, and the artist explicitly associates it directly with blood.
    10. Again, we are dealing with old images, now taken from home albuns, rephotographed and turned red through a digital process, to the extent of becaming almost indistinguishable.
    11. The importance of titles and of words in general at Rennó’s artworks could be the object of an independent essay. I think of the text taken from newspapers and magazines converging on the Universal Archive, a reservoir she uses for her creation, but I also think of a neologism and calembours that are frequently the titles of her works. Recent works such as the video Espelho Diário (2001) and the great installation Bibliotheca (2002) continue in this sense a theme broached in previous works, deepening the literary dimension (oral in the case of the video, and written in the case of the archive cards of the installation) suggested by the titles of the photographs of Série Vermelha (Militares) or, even before, by works such as In Oblivionem (1994), Hipocampo (1995) or Cicatriz.

    Concerning the role of the works in Rennó’s artworks, see also Paulo Sergio Duarte, Para reler o vermelho e o negro, in the folder published by Laura Marsiaj Arte Contemporânrea on the occasion of the exhibition of Rosângela Rennó, in November 2001.
    1. The same thing can also be said about artists: significantly, for a picture produced for the 50th Venice Biennale, Rennó herself used an old family picture where her brother is portrayed in uniform.


    VISCONTI, Jacopo Crivelli. Hidden Evidence. In Shattered Dreams: Beatriz Milhazes Rosângela Rennó. São Paulo: Fundação Bienal de São Paulo, 2003, p. 26-38.